19.4.08

Homem de fé

Não me sinto um homem religioso, mas sim um homem de fé. Quando eu era menino, li um livro muito bonito de Miguel de Unamuno chamado Idéias e crenças e nunca esqueci que ele começa dizendo: "As idéias se têm e nas crenças se está". Posso dizer, até enfaticamente, que vivo uma fé sem religiosidade. Posicionando-me assim, supero a dimensão mais mesquinha da experiência religiosa, o indiscutível autoritarismo das Igrejas... eu não diria que deixei a Igreja, mas me fiz mais fé do que aparato comportamental da religião.

Aqui, talvez, eu possa dizer uma coisa que, do ponto de vista clássico, já é um pecado; não vejo mérito na preservação da fé, porque nos momentos mais difíceis que tenho vivido nesses 75 anos, inclusive na morte da minha primeira mulher, que morreu sobre meu peito, nunca perguntei "por que?". Sempre achei essa pergunta indébita, ou seja, apesar de toda a minha luta no sentido de ser considerado em meu direito de perguntar jamais perguntei "por que?". Essa é uma fé em que vivo em paz - de vez em quando, às vezes, sem paz, pois respeito as posições dos outros. Eu me sentiria um pouco vazio se por uma razão qualquer perdesse a fé.

Paulo Freire, em Pedagogia da Tolerância (Unesp).

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