Imagine que, em vez de um, existissem dois deuses iguais em poder e majestade. Claro que isso só pode acontecer através de um conto. Então, prepare sua imaginação.
Dois deuses existiam. Contudo, eles não se encontravam, porque cada um tinha um reino, um universo próprio e governava segundo sua vontade soberana.
O primeiro amava a todos igualmente. Era santo, justo e verdadeiro. Por amar a todos, não fazia acepção de ninguém nem sonegava de um para dar ao outro. Desejava que todos aprendessem a amar e a compartilhar o que tinham. Ensinava o caminho da justiça por seu próprio exemplo. Sua proposta de vida para o mundo não era o sucesso, mas o significado; não a vitória, mas a igualdade.
O outro deus gostava de todos os que habitavam em seu universo, mas tinha compromisso apenas com aqueles que lhe eram devotos. A estes, oferecia uma vida de facilidades e lhes garantia livramento dos perigos próprios do existir. Assegurava que os devotos fossem recompensados por sua fidelidade.
Todavia, para garantir vida isenta aos devotos, esse outro deus tornou-se um ditador. Ora, isso é óbvio, uma vez que para existir proteção no meio de um perigo, faz-se necessária a coerção do agressor, isto é, a obstrução de seu livre arbítrio. Para que existam ganhadores, também devem existir perdedores. Um mundo constituído só de ganhadores é pura ficção.
Voltando para nossa estória, a questão é que, para garantir a promoção do devoto no emprego, aquele deus precisava barrar o progresso da carreira profissional do não devoto, mesmo que mais competente, de modo a impedir que ocupasse o cargo que, por justiça, deveria ser seu.
Com o passar do tempo, aquele deus tornou-se mestre em derrotar os inimigos daqueles que o amavam e continuava a lhes dar vitória. Mas seus devotos, insatisfeitos, pediam não apenas melhores empregos, mas também prosperidade. Assim, teve de empobrecer alguns para enriquecer os seus, garantindo-lhes uma vida como filhos do Rei. Sim, uns tinham que ser empobrecidos, porque é impossível mexer na história e na economia sem mexer no contexto e com as pessoas que deste fazem parte, uma vez que os recursos daquele universo eram os mesmos para todos. Inicialmente, todos tinham acesso aos bens da natureza, mas o excesso de recursos dados e esbanjados por uns foi proporcional à falta de recursos sentida por outros. Esse princípio era dos mais elementares na economia daquele mundo.
E assim, aquele outro deus tornou-se capitalista, garantindo a riqueza dos seus por meio do empobrecimento dos demais. Colocou os seus em uma redoma de vidro, enquanto o resto de seu mundo desabava em guerras, doenças e misérias.
O tempo passou e passou e passou. O universo do primeiro deus tornou-se justo como ele, feliz e amoroso como ele, um mundo à sua imagem e semelhança. Já o universo do outro deus tornou-se o retrato da injustiça social, da inveja, da cobiça, disputa e da miséria.
Em qual desses dois deuses você confiaria? Em qual desses dois mundos você preferiria viver?
Antes de encerrar, preciso dizer a verdade. Estes dois deuses, de fato, existem no conceito das pessoas. Só que um deles é falso. O primeiro chama-se Jesus. Puro e cheio de amor, veio viver nossa tragédia, para, através da compaixão, libertar nossas vidas e tornar o mundo justo. O outro deus recebe o nome que você quiser dar. Muitos até o chamam de Jesus – mas só como apelido. Todavia, ele não é o fruto do bendito ventre anunciado pelo anjo, mas o produto do ventre de nossa cobiça e do marketing ganancioso das religiões.
A pergunta permanece no ar. Qual dos dois você está servindo?
DOMINGOS ALVES
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