5.12.06

Bem-aventurança

Venho acompanhando suas respostas e o senhor me parece não dar a menor importância à fé. Em seu livro "O Amor Companheiro" há um capítulo chamado "As crenças de um não crente". Temos nos esforçado para criar nossos filhos dentro da religião, mesmo que eles, para nossa tristeza, pareçam desprezá-la. Dostoievsky afirmou que "se não existe Deus, então tudo é permitido". Nestes tempos de falta de ética, o senhor não acha que a religião é indispensável?

A fé, explicou-me um querido amigo religioso, "é a entrega amorosa ao que não pode ser explicado pela razão". Ainda por ele: "Ela é uma mistura de dom e de vontade". Há pessoas afortunadas que têm os dois. Essas sentirão que há alguém por elas, que as protejem, e encontrarão enorme consolo e apoio em suas vidas, diminuindo seus estresses, tocando suas vidas do jeito que podem, entregando a Deus o que não podem. Enfim, é uma bem-aventurança.

Há, porém, aqueles que não foram abençoados nem com o dom nem com a vontade. Estou entre eles. Sou um apaixonado pela razão, e esta me faz ético e solidário com meus semelhantes, mesmo fazendo face ao desamparo e à solidão, características de nossa espécie. Seus filhos podem não ter apreço à religião (que é a fé regulada por alguma instituição), mas podem bem ter fé, se por ela foram abençoados, numa relação sem intermediários com seu Criador. Foi como começou o protestantismo. Não significa que serão pessoas sem altos valores. Tenham fé neles.

Francisco Daudt, em sua coluna na Revista da Folha.

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