4.2.07

Leitura compartilhada (2)

Compulsão é um fenômeno sempre parecido. A perua passa a tarde no shopping fazendo compras para minorar o estresse de não ter o que fazer. Meses depois, descobre que os pares de sapatos ou as blusinhas permanecem intocadas no closet.

Exceto quando estou c/ meus sobrinhos, fujo de shopping centers. No entanto, não consigo resistir à tentação ao entrar em livrarias.

Fruto de um pecadilho há alguns anos, Timbuktu estava perdidão em meio à cordilheira de livros espalhados pelo apartamento. Levei a obra de Paul Auster em algumas viagens, porém ela permaneceu intacta. Como geralmente acontece com funcionários de livrarias, minha alma estava hiante e os pratos lautos do chef americano encontravam-se literalmente ao alcance das mãos.

O escritor usa apenas 144 páginas para retratar a vida de dois vira-latas: Willy e Mr. Bones. Willy é um poeta junkie que alterna períodos de sanidade com delírios, sempre acompanhado por seu cachorro Mr. Bones.

De acordo com a clicheteria reinante, o cão é “o melhor amigo” do homem. Aos que duvidam do ibope dessa relação, basta lembrar a comoção e a avalancha de cartas de leitores quando algum colunista descreve momentos de dor por causa de seus cachorros. Aconteceu isso com a cadela “Mila” do Cony e, mais recentemente, nos últimos latidos de vida do husky Uno do Walcyr Carrasco.

Essa relação quase transcendente entre o homem e o cão é “explicada” por Auster ao afirmar que “a palavra ‘dog’ (cão) encerra um ‘trocadilho celestial’ com a palavra ‘God’ (Deus). Até em trechos mais “rascantes”, o bom humor é a tônica. “Quer saber qual é a filosofia de vida de um cachorro, meu camarada? Vou explicar qual é. Basta uma frase curta: se uma coisa não dá para comer nem para foder, mije em cima dela.” Uma espécie de Eclesiastes canino em versão explícita.

Alguns trechos de Timbuktu me fizeram chorar bastante. Açulados pela inspiração do autor, meus “feromônios eclesiásticos” me fizeram lembrar da matilha de crentes uivando para a lua, já que a comida atirada de muitos púlpitos não chega ao nível do Bonzo. Infelizes, descobrem que buscar acolhimento e afeto em certas igrejas é tão insano quanto o ato de correr atrás de carros.

Hoje o lixo não é acondicionado mais em latas. Entre outros tipos de invólucro, ele é acondicionado nas TVs e até nas páginas de muitas obras, inclusive cristãs. Resta o consolo de que no Timbuktu celestial todas as lágrimas serão enxugadas e o a plenitude do amor banhará nossa vida por toda a eternidade.

5Up
“Prefiro ter uma garrafa na minha frente do que uma lobotomia na minha fronte.”

“De que servia um lar se você não se sentia seguro lá dentro, se você era tratado como um pária justamente no lugar onde deveria ser seu refúgio?”

“E o poeta? Ele acabou se encaixando, suponho, no intervalo entre o melhor e o pior de mim.”

6Down
“...com paixão por livros e por jazz beepop.” A grafia comumente utilizada é bebop.
http://en.wikipedia.org/wiki/Bebop

cotação: UUUU
Curti muuuuuito!!

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