Joseph Ratzinger, o homem, não gosta de rock. É um pianista de formação erudita, conhece bem as obras de Beethoven e seu aniversário de 80 anos foi celebrado na segunda-feira com um respeitável concerto de música clássica. Bento 16, o papa, não está distante. Quer a volta do canto gregoriano às missas, não aprovou a ida de Bob Dylan a um evento religioso em 1997 e sua aparição no Brasil terá, sobretudo, a apresentação de artistas do universo católico.
O papa não quer viver no vazio das celebridades pop e, se tiver de aproximar ainda mais sua Igreja dos jovens, não o fará cortejando o primeiro Mick Jagger que aparecer. Mais conservador que João Paulo II, Bento 16 tem um trunfo para fortalecer sua postura austera. A música da juventude católica não perde mais para o gospel dos evangélicos, nem precisa da bênção da mídia.
Quando falou-se em Sandy & Junior como possíveis atrações do Pacaembu, dia 10 de maio, no Encontro do Papa com os Jovens, a música cristã reclamou. Se não são hereges em potencial, os irmãos jamais falaram de Cristo em suas letras. “Seria a bola mais fora do mundo. Temos talento no meio católico, seria desperdiçar material de casa”, diz Eraldo Mattos, baixista do Anjos de Resgate, grupos de grande expressão no universo religioso.
Mattos tem cacife para cantar neste tom. Sua banda já lançou cinco CDs, um DVD e vendeu, ao todo, 500 mil cópias. São três shows por fim de semana, média que obrigou os músicos a instituir um fim de semana por mês para a família. “Nesse, ninguém toca.” Isso sem nenhuma mídia - ou quase nenhuma. “O site de imagens YouTube acabou virando um ótimo meio de divulgação para a gente, já que não precisa de jabá (pagar para divulgar) para colocar seu vídeo lá”, diz Mattos.
A oferta de nomes levou os organizadores a fazer uma seleção rigorosa. Outro grupo que passou por ela é o Dominus, de Belo Horizonte, especializado em axé music e com trajetória não menos robusta. São seis CDs, um DVD e 90 shows por ano. O fato de falarem de Cristo, como o Anjos de Resgate, não prende o grupo em posturas beatas. Enquanto cantam samba-reggae, seus dançarinos fazem piruetas no palco.
Se axé e pop rock agradariam ao papa? “O gosto musical de Bento 16 não tem nada a ver com a forma como ele conduz a Igreja”, diz o padre Juarez Pedro de Castro, secretário de comunicação da Arquidiocese de São Paulo. “Ele tem uma formação de piano erudito, seu gosto pessoal é pelo clássico, não pelo rock, e sabemos que existe um preconceito de outros músicos da área erudita com relação ao rock. Mas a Igreja respeita as culturas, ela deve entender o jeito de cada nação para poder entender os jovens.”
A tolerância do Vaticano aos estilos musicais tem sido colocada à prova. O CD lançado para a vinda de Bento 16, Bendito o que Vem em Nome do Senhor, traz canções religiosas nas vozes de Elba Ramalho, Joanna, Daniel e Gian & Giovanni, além do Anjos de Resgate. Sem mídia, mais uma vez, o rebanho mostrou sua força. Quase 100 mil cópias já foram vendidas.
É natural que Bento 16 não conheça Sandy, Junior, Elba Ramalho, Daniel. Mas Bob Dylan ele conhece bem, e escreveu o seguinte sobre a ida do cantor americano a Bolonha, na Itália, quando tocou Knockin’ On Heaven’s Door para o papa João Paulo II e outras 300 mil pessoas durante a Conferência Eucarística Mundial: “Havia razão para ceticismo. Eu estava - e de certa forma ainda estou - com dúvidas se era certo deixar aquele tipo de profeta intervir”.
Os profetas são um perigo e Bento 16 expôs a ferida. À Igreja, o ritmo não importa mais do que suas letras. Se um metaleiro gótico falar de paz e esperança, será abraçado pela Igreja. Se um monge incitar a bruxaria em um canto gregoriano, será convidado a se retirar.
fonte:
25.4.07
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