Dois pastores se encontram em uma pequena livraria. Um deles vê alguns livros de autores católicos e aponta para uma das obras.
– Já me falaram que esse padre escreve bem, mas nunca tive coragem de ler o que escreveu.
– Desde quando é preciso coragem para ler um livro? – brincou o colega.
– Disseram-me que ele era gay então não quero ler nada dele. Eu hein!
O episódio emblemático é verdadeiro em todas as nuanças. O “padre gay” do caso tem nome e sobrenome: Henri J. M Nouwen. Com a seletividade comum dos que caminham nas sendas da incongruência, o pastor deixou de mencionar que o escritor era celibatário.
A revelação sobre a homossexualidade de Nouwen está no último capítulo de Alma sobrevivente (Mundo Cristão), um dos melhores livros de Philip Yancey. O subtítulo “Sou cristão, apesar da igreja” ilustra com fidelidade a situação de milhares de pessoas que têm sido feridas dentro das comunidades cristãs.
Henri Nouwen tem todos os predicados para pensar as ulcerações emocionais causadas por diversos tipos de apoplexia despejadas impiedosamente de vários púlpitos. Yancey intitulou o capítulo sobre ele com um verdadeiro epíteto: “O ferido que cura feridas”. Como cantava o poeta Sérgio Pimenta, “só quem sofreu tem palavras de puro mel / Que transmitem todo calor para quem precisa de amor”.
A obra mais famosa do holandês foi inspirada em uma pintura de Rembrandt. A volta do filho pródigo (Paulinas) é um tratado de sensibilidade que deveria ser lido por todos os que pretendem trabalhar na obra do Senhor em quaisquer áreas que envolvam relacionamentos. Ou seja, em todas.
A experiência do escritor ao contemplar a pintura no Museu Hermitage de São Petersburgo me faz sonhar com a possibilidade de um novo frescor nas mensagens pregadas nas igrejas. Como seria maravilhoso se os pastores descobrissem a inspiração que advém por meio da pluralidade das manifestações artísticas. Como disse Rubem Alves, “o ato de ver é uma oração”.
Em Transforma meu pranto em dança (Thomas Nelson Brasil), Nowen novamente toca em pontos doloridos. “Gostamos de vitórias sem esforços: crescimento sem crise, cura sem dores e ressurreição sem a cruz”, afirma. Contrariando o triunfalismo ordinário que enche a burra de ilusionistas travestidos de pregadores, o escritor adverte: “Quanto mais gente você ama, maior é o seu potencial de sentir dor”.
Com a franqueza e a generosidade de quem aprendeu a extrair forças de sua vulnerabilidade, Henri Nouewn evidencia que pranto + dança e fraqueza + força não são componentes imiscíveis, corroborando o registro do apóstolo Paulo.
Nos próximos meses, a Editora Palavra ampliará as opções de leitura do autor com o lançamento de mais dois títulos: Tudo se fez novo e O ministério criativo.
Como disse Jean Vanier no funeral de Nouwen, “a angústia era freqüentemente a força motriz de sua marcha”. Compreender essa faceta da dor nos transporta para outra dimensão de vida.
Em um sentido adverso, Shakespeare colocou o título deste texto na boca de uma das personagens da tragédia Júlio César. Como enfatiza a obra de Nouewn, os gestos das mãos divinas continuam eloqüentes. A despeito de falhas e aparentes labéus, temos um Pai nos esperando de braços abertos. As mãos que abençoam estão prontas para nos acolher.
texto de Sérgio Pavarini publicado na última edição da Ultimato.
22.9.07
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Um comentário:
Esse silêncio urrah...
Não mais, mãos falem por mim,
mas;
... Silêncio grita por mim...
Assunto no bajubá das adés, apesar de não aqüendar...
Jesus também os ama, eu sei.
Como eu sendo mulher poderia entender essa dor. Se do Pai não recebesse o Amor(ágape).
O padre de então, é mesmo uma flor...
O projeto da próxima vida.
A robustez do Amor que fica.
O homem da eternidade.
Anjo meu amigo...
Anjos não têm sexo.
Simplesmente amam, eu creio
e ponto final.
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