1- O que define os negócios em nossa época?
Como disse meu amigo Kevin Kelly - fundador da revista americana Wired e membro da Global Business Network -, não estamos mais numa época de mudança, mas numa mudança de época. Isso requer inovação no sentido mais radical e transformador possível. Por isso, estamos olhando para a fronteira social, ambiental, econômica e tecnológica, para tentar detectar padrões mais profundos de mudanças, algo completamente diferente das práticas da era industrial.
2- Como organizar o processo criativo, de pesquisa e desenvolvimento, nesse ambiente de transição?
Temos um grupo trabalhando em insights de tendências e previsões. Uma dessas macrotendências diz respeito à tecnologia convergir para o aumento da autonomia dos indivíduos, que conduz a uma criatividade coletiva. Os hábitos movem-se de modelos passivos de consumo para atitudes, com base nos próprios conteúdos e gostos das pessoas.
3- Em que momento surgiu no horizonte esse novo consumidor?
Foi há cinco anos. O termo "consumidor" me incomodava, por refletir uma idéia muito passiva e industrial. Agora, com a web 2.0 e logo a 3.0, essa percepção está se materializando. Está se tornando visível a revolução social que a nova tecnologia trará, com criatividade de massa, blogs e variantes do gênero YouTube.
4- Quais setores serão os mais afetados por tal tendência?
A superação do modelo centrado no consumidor passivo está levando ao redesenho de todas as atividades em mercados como saúde, educação, serviços e cuidados pessoais. As empresas começam a perceber que é necessário ter uma estratégia centrada no social. Novas parcerias emergem entre os setores público, privado e o terceiro setor. Boa parte do PIB virá da reinvenção desses setores.
5- Qual a principal contribuição que a senhora trouxe para a empresa?
Dez anos atrás, quando cheguei, a Philips ainda era uma empresa de base muito tecnológica. Minha ênfase foi na necessidade de pesquisar sociedades, culturas e pessoas. E acredito que isso ajudou a transformar a própria empresa. Passamos a desempenhar um papel na área de design, no sentido de levar a empresa a ir além do perfil tradicional.
6- Quais os principais obstáculos nessa reinvenção da empresa?
Por vezes a empresa errou feio, insistindo que a pesquisa tecnológica precisaria andar junto com as pesquisas de consumidores. O primeiro passo foi deslocar a ênfase da tecnologia para o foco humano. Foi crescendo a percepção de que simplesmente seguir o rumo da tecnologia não conduziria ao sucesso. O fato de oferecer tecnologia não significa que o mercado ou os clientes vão aceitá-la.
7- Qual, em síntese, a principal lição a ser extraída de suas pesquisas?
A grande mudança do modelo de produção para estratégias condicionadas pelo mercado e pelo social pode ser resumida em três vetores: criatividade de massa, inovação social e sustentabilidade. Não se consome mais tecnologia, convive-se com ela. Está surgindo uma nova relação ecológica entre as pessoas e a tecnologia. Importante é a combinação de lugar, atividade e experiência. Já não se trata do consumo de um produto isolado, mas de criar sistemas de apoio à vida cotidiana. Isso significa que é necessário reinventar os processos de inovação. Não adianta mais pesquisar os hábitos de consumo. É preciso se engajar, de fato, na vida das pessoas, co-criando as soluções. Sabemos hoje que 75% da inovação vem de sugestões dos usuários. É uma mudança radical que define quem, por que e como inovamos.
8- A cultura em torno da web 2.0 já tem sido fortemente marcada pela dimensão social da tecnologia. Qual será o significado da web 3.0?
Ela terá o caráter de uma experiência ainda mais interativa e imersiva, na linha de um Second Life. Possivelmente haverá ainda mais espaço para a criatividade. O principal elemento é a transformação do consumidor passivo em usuário participante.
9- Além do usuário e da tecnologia, importa a qualidade do uso, em termos de saúde e sustentabilidade?
O século 21 já não enfrenta apenas o desafio de curar doenças, mas sobretudo a necessidade de lidar com males crônicos que resultam do comportamento ou de estilos de vida, como Parkinson, obesidade e diabetes. Significa que uma pessoa pode ficar doente por 20 ou 30 anos.
10- Como as universidades vão preparar o trabalhador do futuro?
Numa época de mudanças, os modelos de aprendizado também precisam mudar. Precisamos de uma experiência de aprendizado diferente. Precisamos de novas teorias e também de novos espaços de aprendizado. Nossas escolas e universidades são basicamente produto do paradigma industrial. O problema é que ainda não se trabalha o bastante para promover a criatividade e a inovação.
fonte: Época Negócios
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