Mas, se a lógica parece tão cristalina, como explicar que existam tão poucas iniciativas nessa direção? Por que as empresas continuam mais obcecadas em copiar as chamadas "melhores práticas" do que em inventar as "próximas práticas"? O problema, alega ele, é que a admi nistração teria se tornado prisioneira de seus próprios dogmas, do mantra da busca de eficiência cada vez maior da máquina, para entregar mais e mais resultados no curto prazo.
Focados no mercado do presente, em fazer melhor mais do mesmo, os executivos já não têm tempo para pensar diferente e preparar a empresa para o futuro. Outra dificuldade é que mexer na administração implica a redistribuição de poder - e quem se dispõe a entregar os anéis sem resistência? Como esperar que os executivos revolucionem a gestão, abrindo mão da própria autoridade?
Não por acaso, Hamel cita como exemplos de empresas que escaparam dessa armadilha nomes como Whole Foods, W.L. Gore e Google - nenhuma delas conduzida por gente que passou por escolas de negócios. John Mackey, um dos fundadores da Whole Foods, a mais inovadora e lucrativa cadeia de varejo de alimentos americana, era recém-formado em filosofia quando abriu a primeira loja da rede, no Texas.
Apostando na tendência de valorização de alimentos saudáveis, produzidos sem riscos ao meio ambiente, criou do nada um negócio que hoje vale 6 bilhões de dólares e que provoca inveja da concorrência: ostenta a maior rentabilidade da indústria e suas ações cresceram 3 000% desde a abertura de capital, há 15 anos.
O segredo da Whole Foods, segundo Hamel, é um modelo de gestão que consegue conciliar liberdade e disciplina; senso de missão com foco em resultados; igualdade de oportunidades com meritocracia. Em vez de lojas ou departamentos, na Whole Foods os centros de lucros são os times. A descentralização é tão grande que até as contratações são decididas coletivamente.
Comprometida com a sustentabilidade, a empresa investe na melhoria dos métodos de produção dos fornecedores, incentiva produtores locais - e ainda consegue fazer o consumidor pagar por isso. Quem trabalha lá sente-se parte de um projeto maior. Os lucros são perseguidos como medida de desempenho, não como objetivo final da organização.
Princípios semelhantes regem a W.L. Gore, gigante nas áreas têxteis, eletrônica e de equipamentos médicos, com 145 fábricas pelo mundo, cujo produto mais conhecido é a fibra Gore-Tex, que revolucionou o mercado de impermeáveis. Na Gore, a democracia é o valor supremo. Trata-se de uma empresa sem chefes, cargos, organograma e foco definidos, na qual as pessoas escolhem os projetos em que querem trabalhar.
Essa aparente anarquia também caracteriza o Google. Por trás desse dínamo de inovação estaria a compreensão de que a estrada para o sucesso é pavimentada por fracassos. No Google, 80% dos projetos de novos produtos morrem antes de chegar ao mercado. Os que vingam, entretanto, compensam todo o investimento feito. Metade dos funcionários trabalha em pequenos times quase autônomos, e o orçamento segue uma fórmula conhecida como 70-20-10 - 70% de recursos para melhoria dos negócios existentes, 20% para sua extensão e os 10% restantes para idéias insólitas que possam render algo novo.
A única empresa brasileira citada no livro é a Semco, de Ricardo Semler. Para Hamel, Semler é um pioneiro da experimentação radical bem-sucedida. Na Semco, todos os empregados escolhem o horário de trabalho, inclusive os operários. A maioria estabelece também o próprio salário, com base em dados internos e do mercado. Não há auditoria nem se conferem relatórios de despesas, porque a base do modelo é a confiança. E, ao contrário das previsões de inúmeros céticos, a Semco não apenas não faliu como mantém um crescimento contínuo.
Para Hamel, é preciso buscar lições para a inovação em sistemas de alta adaptabilidade fora do universo corporativo. Na biologia, por exemplo, em que a adaptação e a evolução da vida se dão por tentativa e erro, aprende-se o valor da experimentação. Outra lição pode ser aprendida com os jogos de azar, que seguem uma aritmética: quanto mais se aposta, mais aumentam as chances de acertar. Para inovar, portanto, é preciso persistir.
No cômputo geral, porém, não existem receitas prontas. Cada organização tem de inventar seu próprio modelo, num compromisso de longo prazo. E todos devem ser chamados a contribuir. O ponto de partida, propõe Hamel, é simplesmente começar a fazer perguntas. A primeira delas, tão básica quanto eficiente, é: o que poderíamos fazer de forma diferente?
fonte: revista Exame
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