19.1.08

O Espírito e a Letra

A interpretação rígida e literal é a espada com a qual os fundamentalistas profanam as Escrituras, a espada com que matam o Espírito, mantendo intacta a letra, esta carcaça salpicada de pólvora. Neste ponto, metade do demoníaco serviço alcançou êxito; resta agora tomar a letra das Profanadas Escrituras e fazer sangrar todo indício de vida e liberdade, estendendo os domínios do Reino da Lei.

O problema do Espírito é que com ele não se domina; é sopro e não cetro, brisa e não espada, e acima de tudo, é tão absurdamente democrático quanto o sopro e a brisa. Calar o Espírito é garantir a hierarquia que ele impede, é impor a autoridade que ele destrona.

Matem o Espírito, mas poupem a Letra, eis uma ordem frequente nos castelos das autoridades eclesiásticas. Afinal, calar o Espírito é uma forma de impedir a compreensão de que não precisamos mais de sacerdotes, posto que somos os sacerdotes de nós mesmos. Trocando em miúdos, o Espírito delata aos homens a imanência do infinito, pondo em xeque o rei que se propõe mediador.

O Espírito, bem o sabemos, alça seu vôo contingente nos ares da liberdade (II Co 3:17), é ali o seu Reino, ali poderemos ouvir a sua voz e vê-lo acalentar, no ninho do chronos, os ovos que produzem a vida eterna. Naquele lugar mágico poderemos saciar nossa fome do ultraterreno, alimentado-se com os ovos da imortalidade. O melhor da história, todavia, é que o Reino em questão se acha em algum lugar dentro de todos nós. Tenho a impressão que se queremos alcançá-lo, o primeiro e fundamental passo é deixar os domínios do Reino da Lei, construído pela espada dos inimigos do Espírito.

Alysson Amorim

Um comentário:

Anônimo disse...

Alysson, gostaria de saber qual texto não deve ser interpretado de forma literal. Jonas no peixe? Morte e ressurreição de Jesus? Relato da Criação? Cura do cego de Jericó?

Pode sar que alguns textos não sejam interpretados de forma literal, mas colocar de modo amplo como você fez, pode criar um relativismo muito perigoso do texto sagrado.

O pecado, a maldade, o sofrimento, o inferno, etc e etc... são literais ou não?

Valeu, até mais, Marcos.

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