Dê-me uma biblioteca em profundo silêncio. Dê-me uma neblina espessa na madrugada. Dê-me um ombro. Dê-me um soneto com versos viscerais. Dê-me canários desengaiolados. Dê-me uma caverna com estalactite. Dê-me velas com cheiro de canela. Dê-me as lágrimas das mães do Congo. Dê-me um alvorecer de pescador. Dê-me a tragédia das Óperas. Dê-me o lamento do sax.
Dê-me um córrego de águas claras. Dê-me uma catedral com sinos a dobrar. Dê-me um céu sem lua e sem nuvens. Dê-me uma segunda-feira feriado. Dê-me um mundo enorme, do jeito que eu enxergava quando menino. Dê-me a cadeira de balanço ao lado do ancião. Dê-me a resiliência palestina. Dê-me a gargalhada dos bebês. Dê-me a chance de pedir a bênção do papai e ouvir pela última vez: "Deus te abençoe, meu filho!".
Dê-me uma conversa de calçada na boquinha da noite. Dê-me a colcha de crochet da mulher triste. Dê-me o cheiro de café no bule. Dê-me a Bíblia da adolescência. Dê-me a aula de datilografia com intermináveis asdfg. Dê-me o campinho onde fui estrela de um futebol sem platéia.
Dê-me o gosto ácido das frutas verdes, roubadas com estilingue. Dê-me o ranger da rede que embalou meu sono. Dê-me o espargir do líquido amniótico que precedeu a vida dos meus filhos. Dê-me o assombro de perceber que Alguém me acompanha de perto.
Soli Deo Gloria.
Ricardo Gondim
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