E pra encerrar o assunto, que é motivo de reportagem na Veja deste sábado: algumas notas sobre a tentativa de linchamento na novela e a assim chamada “questão religiosa”:
Sou católico. Mas, por razões que não vale a pena aqui relatar, entreguei minha vida aos evangélicos. Um pequeno grupo deles é que cuida de mim, do meu gato Tadeu, e de tudo que está relacionado com o meu bem estar e o bom funcionamento da minha casa. Uma delas está comigo desde 1992, e eu não estaria mentindo se dissesse que faz parte da minha família.
Tenho a mais absoluta confiança nessas pessoas. Quando vou pra Portugal e lá permaneço, algumas delas, pra melhor cumprir com suas tarefas diárias, chegam até a se mudar pra minha casa.
A única coisa que elas não fazem é limpar minha coleção de obras de arte, pois eu a considero intocável, e não abro mão de limpá-la eu mesmo.
Portanto, podem me acusar de tudo, menos de ter algum tipo de preconceito em relação aos que se dizem “cristãos” (como se nós, os católicos, não o fôssemos...).
Da mesma forma, não posso dizer que esses evangélicos tenham algum preconceito em relação a mim, embora lavem meus lençóis e saibam tudo sobre a minha vida íntima.
Ao longo desses anos, essas pessoas, por força da nossa convivência, se tornaram os maiores fãs das minhas novelas. Desde PEDRA SOBRE PEDRA que não perdem uma delas.
Mas poucas semanas depois de estreiar DUAS CARAS, por causa da mais completa ausência de comentários deles a respeito, eu descobri que não estavam a vê-la. Não resisti e perguntei:
“Por que vocês não estão vendo minha novela?”
E a mais antiga me respondeu pura e simplesmente:
“Porque o pastor nos proibiu de vê-la”.
“Por qual motivo?” - insisti. E ela me explicou:
“Por causa do Pastor Lisboa”.
O pastor Lisboa, vocês sabem, era aquele personagem que colocava sua fé acima de tudo, e que não deixava sua absoluta confiança em Deus fraquejar nem mesmo nos piores momentos, como foi aquele da morte de sua filha.
Por que razão o pastor da vida real considerou esse homem íntegro e justo tão perigoso a ponto de proibir seus fiéis de ver a novela na qual ele era um personagem?
Por favor, não me façam essa pergunta – eu não saberia respondê-la.
Mas foi por causa dessa incompreensível rejeição dos evangélicos a um personagem que os representava tão bem, que tirei o Pastor Lisboa da novela, embora venha preparando terreno pra fazer com que Ezequiel, outro fiel temente a Deus, venha a substitui-lo, pelo menos ao final da minha história.
Agora, por ter feito a fanática Edivânia liderar a tentativa de linchamento de Dália, Bernardinho e Heraldo, me acusam de “inimigo dos cristãos e de suas igrejas”. Edivânia liderou sim, mas na turba ensandecida havia representantes de todas as religiões. Pensei até em colocar naquela confusão uma mulher vestida com uma burka, mas depois achei melhor não meter a mão nesse vespeiro.
De qualquer modo, gostaria de deixar bem claro qual foi a minha intenção ao escrever a tentativa de linchamento: eu queria mostrar que não há igrejas melhores nem piores, mas que são péssimas quaisquer formas de fanatismo ou de preconceito. Ezequiel e Edivânia são as duas faces de uma mesma moeda, porém, num jogo de cara e coroa, seria positivo se o primeiro levasse a melhor.
E pra não fugir do tema, que é FANATISMO: no começo da novela eu também fui apontado por alguns rapazes baianos como o inimigo número um dos homossexuais, por fazer Bernardinho, um gay de carteirinha, se sentir atraído por Dália. Logo eu que, quando tinha quatorze anos, escancarei as portas do armário e saí lá de dentro usando saltos altos e nuzinho em pelo?!...
Cada qual com seu cada qual, ninguém se mistura, não há contradição possível... Que coisa mais careta, gente! E a coragem e a ousadia: a gente joga no lixo?
fonte: blog do Aguinaldo Silva
18.3.08
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