Tiago Coutinho
especial para O POVO
O século XX foi marcado por diversas truculências. Além de duas grandes guerras, tentou-se assassinar a história, a narrativa, o romance, a verdade e Deus. Deus não morreu. Ele chega ao século XXI com plenas forças e garante a adesão de mais de 80% da população brasileira. O Vida & Arte Cultura propõe, no domingo de Páscoa, uma discussão sobre Deus e os limites de seu império
Está escrito no livro de Salmos da Bíblia, "Diz o insensato no seu coração: Não há Deus. Do Céu olha o Senhor para os filhos dos homens, para ver se há quem entenda, se há quem busque a Deus". Quem entende a Deus, aquele que carrega em sua essência vários mistérios? Nos limites da ciência, o mais óbvio seria negar sua existência. Aos fiéis, restam as crenças, a busca da explicação para o inexplicável.
Do antigo testamento, aos primórdios do século XXI, a imagem do Deus cristão sofreu várias modificações. Ao contrário do que muitos pensam, esse Deus cultuado no Ocidente é uma herança Oriental e resultado de muitas batalhas com o povo persa. Deus se estabelece no Império Romano como monoteísta durante a Idade Média, mais precisamente em 392, no império de Teodósio. Depois, fez de sua imagem semelhança, com o sacrifício de Jesus, seu filho. Segundo o historiador medievalista Jacques Lê-Goff, em seu livro O Deus da Idade Média, a crucificação miserável de Jesus foi responsável pela expansão do cristianismo. A morte de Cristo significa a possibilidade de salvação de todos os povos.
Impossível de se contar a história de Deus. Tantos mistérios existem na santíssima trindade que discuti-la de forma racional, seria um tanto quanto inviável. Alguns, no entanto, enveredam-se por este caminho e possuem a preocupação de tentar matar Deus. No período entre o final dos séculos XX e XXI, cresce o número de publicações com essa temática. Os filósofos franceses André Comte-Sponville e Michel Onfray publicaram, no ano passado, respectivamente, os livros O Espírito do Ateísmo e Tratado de Ateologia, ambos pela editora Martins Fontes. Enquanto Onfray busca apresentar fundamentos para uma ateologia e tenta desconstruir as religiões monoteístas, os princípios de valores cristãos e condena qualquer sentimento de teocracia, Comte-Sponville, mais sereno, argumenta seis motivos para justificar a opção de não crer em Deus, além de mostrar como é possível se buscar a espiritualidade, seja no sexo, no esporte ou em outras atividades humanas.
O professor Ricardo Mariano, do departamento de Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, acredita que essas publicações vêm como resposta da academia a uma reação religiosa que ocorre na sociedade. "Esses diversos livros se tornaram verdadeiros fenômenos nos últimos anos e estão relacionados ao avanço de grupos religiosos, seja no grupo político ou midiático". O pesquisador dá como exemplo a sociedade estadunidense, onde se percebe o avanço das teorias criacionistas, principalmente nas escolas primárias.
Ele ressalta que, embora perceba essa expansão de estudos contra Deus, não se conhece nenhuma estatística que mostre o crescimento contínuo do número dos ateus e/ou sem-religiões. No Brasil, o último censo realizado sobre o assunto data de 2000. Os números dizem que, entre os anos de 1991 e 2000, o número de cristãos (católicos e evangélicos) caiu de 91% para 89%, enquanto a quantidade de ateus ou sem-religiões no Brasil subiu de 4,7% para 7,4%.
O crescimento é significativo, mas de acordo com o físico e teólogo Eduardo Cruz, professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, o termo sem-religião não significa a negação de Deus. "Muitas dessas pessoas podem não ter religião, mas acreditam em Deus, ou se valem de valores cristãos", afirma.
Outra fonte curiosa é a pesquisa divulgada em maio do ano passado pelo Instituto de Pesquisa Datafolha. Os dados confirmam uma diminuição do número de cristãos para 86%, mas eles permanecem como esmagadora maioria. O número de ateus e/ou sem-religião estagnou-se nos mesmos 7%. O diferencial desta estatística está no aumento de movimentos espirituais como espíritas, religiões afrobrasileiras e outras que correspondem 5% dos brasileiros.
Não há ciência que consiga provar ou negar a existência de Deus, mas os números mostram como a presença de sua imagem, seus valores e sua ética tendem a não ser esquecida na humanidade por um bom tempo.
Fonte: Jornal O Povo
Um comentário:
Aí leu um livro com qualidade! Esse da editora Palavra: Mente em chamas de Blaise Pascal é bom com força =)
Não me esqueço de uma citação dele:“Estudiosos piedosos são raros.” Pág. 259
abração Pava
continue nessa sua raridade
FELIZ PÁSCOA
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