Pode vir pela frente um calçado Ball Star, Nibe, Keppa, Pmua ou Avivas. Apesar da confusão fonética, a confiança que os chineses pirateiam melhor que soletram faz a negociação continuar. As marcas com grafia errada servem para os produtores driblarem os direitos de propriedade, além de também se prestarem para pegar o consumidor local, pouco habituado com as letras latinas.
Para o momento da pechincha, a calculadora é indispensável. A comerciante digita nela um valor, em geral seis ou sete vezes maior do que o pisante merece. A técnica pega o turista desavisado, que sai achando que fechou bom negócio pagando a metade do preço.
Esse é o cenário no Silk Street Market, terceiro destino mais visitado da capital chinesa, só atrás da Cidade Proibida e da Grande Muralha. É um shopping de pequenos estandes separados por divisórias plásticas, o mesmo modelo que chegou ao Brasil pela comunidade oriental e via Ciudad Del Este. A sensação de estar em uma cidade paraguaia em plena Pequim aumenta quando a vendedora ensaia um espanhol: “Hola, amigo, balato pala ti ” (sic). O prédio concentra os ambulantes que antes vendiam na tradicional rua da Seda.
Desde a década passada, a China virou o paraíso dos falsificados ao mesmo tempo que se transformou no galpão fabril do mundo, papel esse que coube à Inglaterra no século 19. O país comunista abriu sua economia para o capital estrangeiro, mas um dos preços para desfrutar de 1,3 bilhão de consumidores maravilhados e trabalhadores baratos foi a tal “transferência de conhecimento”, eufemismo para cópia.
A Honda, do Japão, entrou, mas teve de enfrentar a concorrência das motos locais Hondga. Já a GM, dos EUA, teve de engolir um decalque de um carro seu por uma fábrica estatal para não brigar com o governo chinês.
Os chineses inventaram a bússola, a pólvora, o papel, o macarrão e os concursos públicos, mas hoje em dia deixaram a criatividade de lado e querem mais é copiar. Até o guaraná Antarctica, marcas de café e os orelhões ganharam versões genéricas por lá – na região das embaixadas em Pequim, um ambulante oferece por R$ 1 um DVD do filme nacional “Cidades dos Homens”, com o atrativo de se ver uma favela carioca com todos falando em chinês.
Isso gera um prejuízo de US$ 4 bilhões para o Brasil, mas uma cifra pequena para os US$ 84 bilhões anuais para empresas dos EUA, Europa e Japão. Mas isso é só um efeito colateral de converter o país ao capitalismo, produzindo 70% das máquinas de fotocópia, dos fornos de micro-ondas, dos tocadores de DVD e também dos sapatos do mundo.
Se o país hoje é conhecido pelos manufaturados perecíveis, o momento da virada se aproxima, como aconteceu com o Japão entre os anos 70 e 80. A China está se especializando em produtos de ponta, passando os EUA como maior exportador de tecnologia de informação, como celulares, laptops e câmeras digitais. Além disso, é o país que mais forma engenheiros e geneticistas no mundo.
Mas, neste ano em que a China recebe as Olimpíadas, o evento virou o alvo principal dos piratas, apesar da repressão do governo. A alguns metros da loja oficial de produtos licenciados, na rua central Wangfujin, uma vendedora se aventura a oferecer uma camiseta falseta com o logo dos Jogos. Ela busca no depósito, afinal, se tivesse exposto junto com as outras (com imagens de Mao Tse-tung ou de pandas fazendo taichi) seria presa. Ela pede 60, mas, após sessão de pechincha, faz por 30. Tudo isso para desbotar na primeira lavada.
No mercado de eletrônica não é diferente, mesmo com o paredão de neon e os telões hi-tech na fachada do prédio modernoso. São numerosas as marcas "disléxicas", afinal, os sinais gráficos sobre os produtos são mais um desafio para o consumidor, como na perturbação de leitura diagnosticada pela medicina. Polystation ou Popstation são mutações do original Playstation. A mania mundial i-Pod, da Apple, ganha similares como i-Bob ou Oppo. Nokia vira Nckia. A Sony tem sua versão feminina Sonia ou versão "sopa de letrinha" Sqny. É engraçado, mas só compre se estiver montando uma coleção sobre o assunto.
fonte: UOL
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