Os últimos ataques de vírus em computadores mostrou uma fragilidade que a revista Times denominou de "perigos da monocultura". Assim como a virulência dos novos vírus que atacam seres humanos se origina do desmatamento e da diminuição da bio-diversidade, a destrutividade dos vírus de computador também se origina na pouca diversidade de mídia. A grande maioria dos computadores deste planeta utiliza o mesmo software tornando os bancos de dados de nossa civilização extremamente vulneráveis.
Para os "grafiteiros virtuais" esta monocultura é extremamente atraente pois poucas formas de chamar atenção se aproximam da sensação de apertar um único botão e ver, em efeito dominó, sua criação deixar marcas planetárias.
Não há dúvidas de que a internet se transformou num modelo de interatividade e com isso um dos melhores modelos ecológicos que dispomos. E através dela estamos conhecendo os perigos da padronização em qualquer sistema de interação. O ecossistema se fragiliza quanto maior for a homogeneidade.
A monocultura em florestas ou na agricultura destrói lentamente a vitalidade do meio ambiente, o que parece ser verdade também para a mídia. Quanto mais uniforme a mídia, quanto mais os meios de informação bebem das mesmas fontes, mais superficial e menos crítica fica a nossa civilização.
Os programas de televisão são um excelente exemplo. Há poucos anos atrás a televisão pelo mundo a fora era diferente. Hoje, mais do que os "enlatados", é assustador ver que programas de auditório, talk-shows, noticiários ou mesmo novelas, apenas mudam de idiomas mas são absolutamente idênticos.
Que "redes", que "nets" são essas que acabam produzindo mono-experiências e se tornando aversas à diversidade? Que "net" a televisão produziu? Que "net" a informação eletrônica produziu? Que "net" o fast-food produziu? Será que a "net" realmente significa uma "rede" ou estará cada vez mais próxima de um único "nó", um grande "site" com variações de design?
Será que a demanda por "conteúdo" na internet não é uma descoberta de que de ".com" a ".org", de portal "x" a portal "y", tudo começa a ter a mesma cara? Como produto de monocultura, o plantio e a colheita são mais fáceis e rentáveis, mas o produto tem menos sabor e menos nutrientes. E há sempre a praga do "marketing", o agrotóxico que incha fenômenos vazios ao invés de fazer uso do antigo e natural fertilizante que é a criatividade.
Exemplo matriz de construção de uma rede encontramos na Criação, no primeiro capítulo de Gênesis. Lá a explosão de diversidade parece ir gradativamente, dia a dia, produzindo uma rede mais vital. Mas é talvez no relato da Arca de Noé que o "toque" venha de forma mais direta.
Ao pensar na reconstrução do mundo, ao lidar com a reativação de uma rede, não houve dúvida de que não era apenas a semente que deveria ser preservada, mas a diversidade. Tudo que é "mono" parece estar na contramão das redes e da vida. Tudo que é "mono" deprime, debilita e termina por aniquilar a vida.
Perguntariam os provocadores: Mesmo a "monogamia"? Sim. Quando a "monogamia" é vivida como um mesmo do mesmo, quando os casais se misturam e se confundem, quando a relação é invadida por atividades que não diferem em essência, então qualquer vírus de discórdia faz grandes estragos no hard-disk do coração.
E o "monoteísmo"? Com certeza também. Quando ao invés de um D'us único, o monoteísmo se transforma numa visão única deste D'us, então basta um vírus de intolerância, que em condições normais seria neutralizado, para fazer grandes estragos.
No fundo da questão da padronização talvez esteja a "mono-motivação". Mesmo as mentes mais criativas quando aplicadas unicamente à busca de dinheiro, se tornam iguais. E aqui fica um alerta e uma diferença muito grande entre a rede da vida e as redes que estamos tentando criar. A primeira parece ter uma finalidade, um fim que a constitui. A nossa cresce como um "meio", uma mídia. Sem a clareza de um fim, ela não se ramifica e se torna diversa, muito pelo contrário. Produz o mesmo e desertifica.
Nilton Bonder, rabino e escritor.
26.4.08
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