Um casal e um amor sem fim: Guilherme e Cristiana. União feliz, com alegrias e problemas como todas as outras.
"Eu acho que olhar para o lado e saber dar valor para aquela pessoa que está ali é uma qualidade minha e era do Gui. Saber viver aquilo, naquele dia, sem esperar que alguma coisa aconteça para dar valor", conta a publicitária Cristiana Guerra.
Alguma coisa iria mesmo acontecer. Mas antes, na barriga dela, começou a bater um coraçãozinho. Guilherme nunca foi tão feliz como durante a gravidez. Companheiro de todos os exames, cursos, sensações, ficou grávido também.
"Realmente, eu acho que o Francisco foi um grande presente, mesmo ele não tendo conhecido o filho", diz Cristiana.
Quando Francisco veio ao mundo, há um ano, Guilherme já tinha partido havia dois meses. Teve morte súbita. Aos 38 anos, o coração dele parou de bater em uma manhã de verão.
"Teve momentos em que olhei para cima e perguntei: 'Por quê? Por que eu? O que você tem contra mim?'. Me senti revoltada. A gente passa por momentos assim", diz Cristiana.
É difícil mesmo. Nós fomos acostumados a pensar que a morte é companheira da velhice. Vivemos como se essa hora não existisse. E quando alguém querido morre, muitos passam, pela primeira vez, por uma vivência espiritual. Essa é apenas uma das muitas descobertas.
Quando conseguimos atravessar o luto, manter a vontade de viver, apesar de tanta dor, é uma questão de sobrevivência. Mas o caminho é lento. Perder alguém é como perder parte do próprio corpo. A sensação é de que sempre está faltando algo na vida. O professor e psicanalista Roosevelt Cassorla diz que é preciso vencer várias etapas até que o sofrimento se transforme em lembrança.
"O tempo, e somente o tempo, permite que a nossa mente se rearranje. É como se nós precisássemos de um tempo para voltar a cair na real. Cair na real significa o seguinte: a morte existe, as perdas existem, mas eu tenho que continuar vivendo a despeito das perdas", explica o especialista.
Francisco tinha alguns meses quando Cristiana decidiu escrever sobre sua vida para alguns amigos do trabalho.
"Quando eu comecei a escrever o texto, pensei que era para falar do Gui para o Francisco. E quando entendi isso, aí que comecei a fazer o blog. Foi a grande virada no luto, o começo de uma resolução maior", lembra Cristiana.
Transformar em palavras aquilo que o coração sentia. Aproveitar a intensidade dos sentimentos para imortalizar emoções. Escrevendo, Cristiana colocou em ordem a confusão emocional. A cada linha, alivia a alma e mantém viva a sua história de amor.
"Quando eu quis engravidar, engravidei e perdi. A gravidez que me trouxe o Francisco não foi planejada, mas muito bem-vinda. Então, não fazemos as coisas na vida na hora que queremos. Não controlamos a vida. Para mim, esse é o aprendizado", diz Cristiana. "Eu me sinto muito privilegiada de ter tido uma história de amor com o Gui, que foi maravilhosa, que me modificou como pessoa profundamente".
A tranqüilidade de hoje veio depois de muitas provações. Pessoas queridas que se foram cedo demais, como o pai e a mãe. Ainda assim, Cristiana encontra forças para continuar encarando a vida sem medo.
"Eu não vim ao mundo para perder. Acho que aprendi, com tudo isso, a olhar para a vida e perguntar: 'O que ela tem para me dar?'. Ao invés de olhar para a falta, vamos olhar para a presença", constata Cristiana.
Foi assim que Cristiana enxergou no sogro e na sogra o carinho para seguir adiante. E eles descobriram que Francisco, um cisco de gente, é a vida que se renova.
"É um presente. Eu perdi uma dádiva e ganhei um presente: uma filha que sabe fazer limonada de um limão e que alegra a gente todo fim de semana. O Francisco é um pedacinho do Guilherme. E ele é escrito: o jeito, a cara, o humor. É incrível. Então, eu só sinto pena por ele não ter visto o filho", lamenta a decoradora Déa dos Santos.
A alegria inocente do neto faz o luto da avó doer menos a cada dia. Dona Déa se apóia também na fé e nunca antes suas poesias tiveram tanta força.
Pastor da Igreja Batista, o consolo de Ivênio dos Santos é acreditar em um reencontro com o filho, onde ele estiver. "Não há dúvida de que sentimos dor. Sentimos a separação, a falta. Mas o que traz grande consolação é saber que o Guilherme não deixou de ser, que a morte não é uma cessação como alguns crêem, que termina tudo no pó. Não. Para nós, a morte é uma promoção", diz Ivênio dos Santos.
Promoção que, para os cristãos, levou Guilherme a um lugar de paz e fraternidade.
"Hoje nós somos pessoas melhores, porque a dor deixa as pessoas mais fraternas, mais humildes. Elas têm empatia com o que o próximo está sentindo. Então, eu não sou a mesma de ontem", avalia dona Déa.
"Por um lado, acho injusto não poder pôr meu filho no colo do pai dele. Mas eu não quero ficar olhando para essa injustiça. Eu quero olhar para ele e ver como ele é lindo, como ele é inteligente, como ele está feliz", finaliza Cristiana.
fonte: Globo Repórter
colaboração: Moisés Gomes
Clique aqui p/ conhecer o "para Francisco", o blog de Cristiana Guerra. Entre outros livros, Ivênio dos Santos é autor de Alma Nua (Editora Palavra).
2 comentários:
Gostei do novo layout.
Bacanasso!
pavarini, vc quer ser alvo (de tira ao alvo) das mulheres? muda essa frase aí, mermão!
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