"Cada indivíduo é único e cada indivíduo é inúmeros indivíduos que ele não conhece" (Octavio Paz).
"Todo o prazer quer a eternidade" (Nietzsche).
"2,3,4,5,6,7,8... tá na hora de molhar o biscoito!" (Gabriel Pensador).
"O homem terá a Sodoma e a mulher terá a Gomorra" (Marcel Proust).
Para cada sapatão assumido, há pelo menos 10 só no sapatinho (Joeblack).
Cada indivíduo é uno, singular, irredutível. Contudo é, ao mesmo tempo, duplo, plural e diverso. A espécie humana é una, mas, num sentido, dupla, separada e unida pelo feminino. A diferença entre o feminino e o masculino não é somente cultural como assinala Simone de Beauvoir. É também anatômica, fisiológica, hormonal e, num sentido, mental, se existe de fato predominância (inata ou adquirida) do hemisfério cerebral direito na atividade mental feminina e do hemisfério esquerdo na masculina.
As culturas estabelecem, fixam, mantém e amplificam uma diferenciação entre homens e mulheres em papéis sociais, especializando-os nas tarefas cotidianas; sobredeterminam as diferenças psicológicas. Instituem um poder masculino que, salvo exceções, atuou continuamente na história das civilizações. Só recentemente começou a atenuar-se no mundo ocidentalizado.
As emancipações femininas não se realizam somente na obtenção de direitos cívicos, mas também na aquisição de autonomia de espaço e de tempo, de acesso às possibilidades de libertação das consequências da procriação e do coito (anticoncepcionais, legalização do aborto) e à possibilidadde de um gozo sem entraves externos.
Ao contrário da idéia ainda dominante, as culturas arcaicas basearam-se na complementariedade do masculino - feminino; o homem caçador aliou-se com a mulher coletora; as artes marciais aliaram-se com as artes domésticas; em suma, a civilização foi fundamentalmente bissexuada. O monopólio do poder político, na formação e no desenvolvimento das civilizações históricas, deu aos homens um poder criador, construtor e destruidor desmedido em relação ao das mulheres.
No século XIX, a sociedade feminina culta, constituindo o principal público da literatura, cercada de escritores e patrocinando poetas adolescentes, conseguiu desenvolver contravalores de sensibilidade, de amor, de estética, cujos frutos sublimes do romantismo europeu surgiram do encontro entre os mistérios femininos e os da adolescência.
A mitologia é masculina, mas comporta um profundo culto das heroínas e deusas (Ísis, Ishtar, Tanit, Kali Vênus, Atenas); a cabala ensina que o Deus macho não é nada sem a sua Sekkina, Sabedoria feminina.
No texto hebraico de Gênesis que relata o ato de criação, a deusa Elohim é quem comanda a construção do universo. Jesus no período pós-ressurreição repassa o comando do universo ao Espírito Santo (Pnema que é uma palavra feminina na língua grega), podendo nos dar a idéia de uma mãe que nos consola e não faz acepção de filhos. Deus é pai (macho), deusa mãe (fêmea), e Filho que é fruto dessa relação.
O dogma católico da trindade sagrada está sedimentado na idéia de família. A poesia masculina é um múltiplo cântico de adoração do feminino. Goethe exaltou o eterno feminino que "sempre nos arrasta para o alto"; Rimbaud sonhou até ao desespero com a mulher "irmã de caridade", mãe - esposa - amante - irmã.
Na realidade, na civilização do poder masculino, o homem todo-poderoso submete-se ao poder doméstico da esposa, ao poder erótico da amante, ambas reconhecidas como donas (dona da casa, dona do amor). Chega a ser dominado pela amada, como Pirrus que se tornou cativo da sua cativa Andrômaca.
A relação é, de fato, complexa, pois o homem dominador pode ser dominado, fascinado, enfeitiçado pela mulher. Mas se nas poesias e nos romances ele sucumbe ao amor ou ao eros, é capaz de conduzir eficazmente sua vida prática, mesmo estando obcecado pelo grande amor; assim, Bonaparte envia cartas inflamadas a Joséphine durante a campanha da Itália, mas não se distrai nem um pouco da estratégia de guerra e arrisca a vida na ponte de Arcole.
Cada sexo comporta o outro de maneira recessiva e mesmo anatomicamente o homem tem seios, porém estéries, e a mulher carrega um sexo masculino embrionário no clitóris; há homens mais ou menos efeminados e mulheres mais ou menos masculinizadas, além de toda a gama de bissexuais, homossexuais e transexuais que escapam à perspectiva simplificadora.
Esses seres transdisciplinares, tão visíveis hoje, sempre existiram, a despeito das interdições e dos tabus que os empurraram para a clandestinidade nas culturas tradicionais. Além disso, como bem salientou Jung, a alma feminina - anima - está presente no homem de modo recalcado; por isso, muitos homens buscam e encontram a sua alma na mulher amada; da mesma forma, o espírito masculino empreendedor, energético - animus - está presente na mulher de modo recalcado; por isso, muitas mulheres procuram e encontram seu animus no homem amado.
Nossa civilização favorece o surgimento de sentimentos, sensibilidades, qualidades, tarefas e carreiras profissionais de cunho unissex. O unisexo não significa a abolição da diferença dos sexos, mas o reconhecimento da parte comum entre eles.
Há intimidade extraordinária na diferença irredutível e, enfim, há presença, escondida, recalcada ou invisível, do outro sexo no interior de cada um. Sem dúvida, do ponto de vista espiritual, há uma realização andrógina desejável. Michelet dizia: "Tenho os dois sexos da mente".
Assim, pode se afirmar: cada ser humano, homem e mulher, contém a presença mais ou menos marcada, mais ou menos forte, do outro sexo. Cada um é de certa maneira hermafrodita. Carrega essa dualidade na sua unidade. Se liga! não somos apenas uma coisa. Somos uma coisa e outra.
Joevan Caitano, no blog Joe Black.
4.5.08
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