O que me fez querer estudar Teologia foi a necessidade de entender o que significava todas aquelas histórias contadas cheias de acontecimentos extraordinários, difíceis de serem compreendidas no dias de hoje. Tanto é difícil que nas Missas, invariavelmente, os textos começam com os termos "Naquele tempo", o que nos induz a pensar que hoje não é mais assim.
Minha fome de compreender era e é ainda grande que não bastava o curso, mas eu precisava ler muitos livros de Teólogos de renome. Não só livros de Teólogos, mas também Bíblias na sua língua original, qual seja, hebraico e aramaico para o Antigo Testamento e em grego para o Novo Testamento. Hoje tenho perto de 200 livros de Teologia na minha estante. Nada contra ter os livros, afinal tem gente como eu que precisa aprender assim.
Depois que avancei no curso passei a me considerar pronto para dar algumas palestras sobre Teologia e Religião e assim comecei a fazer. Para melhor fazer as minhas apresentações comprei um laptop e um data show. Agora eu já estava pronto e comecei minhas andanças pelo Rio de Janeiro afora.
Um dia, já está fazendo quase dois anos, eu fui dar uma palestra em uma Paróquia no distante bairro de Senador Camará. O tema daquele dia era a "Parábola dos trabalhadores enviados à vinha" (Mt 20,1-16), a passagem em que Jesus conta a história de um homem que vai às 9 da manhã e chama um grupo de trabalhadores para trabalhar na vinha, volta as 10 e chama outro grupo, repete o chamado as 11 e assim vai até o final do dia. Terminado o dia o homem paga o mesmo valor a todos independente da hora em que chegaram.
Eu estava bem preparado para explicar essa parábola. Tinha estudado o significado daquele texto em 3 ou 4 autores diferentes. Tinha quase 20 quadros para apresentar, mas antes de iniciar a apresentação e como sempre costumo fazer, eu perguntei o que é que eles entendiam daquela história e ai veio a minha surpresa.
Um homem muito simples, como todos daquela região, levantou e me disse:"Ah seu moço, essa é muito simples. Aqui ela acontece toda semana". Não me lembro o nome dele, na verdade eu nem perguntei o seu nome, portanto daqui para frente o nome dele será "Zé".
Então eu disse ao Zé:"Pois então Zé, explique o seu entendimento"."Seu moço, vou explicar pro senhor, pois aqui todo mundo sabe direitinho o que isso quer dizer".
Então o Zé começou. Certamente ele nunca leu a metade dos livros que eu li e, talvez, nem mesmo a Bíblia ele tenha lido, e menos ainda a tal passagem, também não tem laptop e nem data show.
"Seu moço, isso acontece aqui toda semana". Pausa e penso: não é "Naquele tempo", mas acontece toda semana nos dias de hoje.
"O senhor vê que aqui tem muitas construções de casas. Nós mesmos é que construímos, um pouco de cada vez. No final de semana, se não está chovendo, a gente aproveita pra fazer a laje de uma casa e o senhor sabe que fazer a laje não pode parar, tem que ir até o final".
Onde vai parar a Teologia do Zé, é o que fico me perguntando.
"Pois é seu moço, nesse dia o trabalho começa cedo e vai até terminar. Quando termina tem a festa da cumieira que a gente come uma boa feijoada. Tem gente que chega às 7, outros às 9, outros às 10, e assim vai até terminar. Depois todo mundo come a feijoada e não é dividido, um come mais e outro come menos, pois não existe 'meia feijoada', ou tem ou não tem, ou é feijoada ou não é feijoada. Se veio, come, se não veio, não come".
Depois da explicação do seu Zé, é, agora já é seu Zé, eu fechei o laptop, desliguei o data show, e disse pro seu Zé:
- Seu Zé, vem aqui pra frente e eu vou pro teu lugar, porque tem algumas coisas da Bíblia que eu queria que o senhor me explicasse.
Agora eu sempre faço da seguinte forma: se eu tenho tempo, eu leio meus quase duzentos livros pra entender, mas se eu não entendi, ou se não tenho tempo, eu corro pra Senador Camará pra perguntar pro seu Zé o que é que aquilo significa.
Em menos de dez minutos o seu Zé me explicou nos detalhes o que é Reino de Deus e que lá não tem "meia feijoada".
João Carlos Teixeira Carneiro, no site SRZD Fé.
colaboração: Paulo Evangelista
25.6.08
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Um comentário:
Caramba, que história bonita ;)
nota brasileira: em Brasília, o dia da feijoada é sexta ;)
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