5.6.08

Má-ternidade (5)

Querido filho,

Te escrevo estas linhas para que saibas que estou viva. Te escrevo devagar porque sei que tu não consegues ler rápido.

Bom, não vais mais reconhecer a casa quando vieres, porque a gente mudou.

Finalmente enterramos teu avô. Encontramos o cadáver com esse negócio da mudança; estava no armário desde aquele dia em que ganhou da gente brincando de esconde-esconde.

Hoje tua irmã Júlia teve um filho, mas como ainda não sei se é menino ou menina, não posso dizer se você é tio ou tia.

Quem não tem aparecido por aqui é o tio Venâncio, que morreu totalmente no ano passado. E teu primo Jacinto, que sempre acreditou ser mais rápido que um touro, comprovou que não era.

Estou preocupada com o cachorro Boby, que insiste em perseguir os carros parados e está ficando cada vez mais chato.

Ah! Finalmente os engarrafadores de refresco tiveram a grande idéia de pôr um letreiro na tampinha que diz: "Abra por aqui".

Que achas? Teu irmão José fechou o carro com a trava e deixou as chaves dentro; teve que ir lá em casa para pegar a chave duplicata e poder tirar todos nós de dentro do carro.

Esta carta te mando com Manolo, que vai amanhã para aí. A propósito, será que podes pegá-lo no aeroporto?

Bom meu filho, não escrevo o endereço porque não o sei. É que a última família portuguesa que vivia aqui nesta casa levou os números para não terem que mudar de endereço.

Se encontrares a dona Maria dá um alô da minha parte; caso não a encontres, não precisas dizer
nada.

Tua mãe que te ama:

EU

P.S. Ia te mandar cem escudos, mas já fechei o envelope.

Um comentário:

vitorferolla disse...

Muito engraçado... =P


Abração Pava
Fique na Graça

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