Barack Obama e Bill Clinton desentenderam-se com os grandes nomes do mundo da mídia, mas isso não os ajudou em uma ocasião recente, quando enfrentaram uma repórter amadora californiana de 61 anos que brandia um gravador digital Sony de US$ 40. Mayhill Fowler, uma blogueira do site "Huffington Post", da especialista em política Arianna Huffington, representa um fenômeno novo em anos de política eleitoral.
Apesar de toda a maestria demonstrada pelos candidatos perante as câmeras de televisão, nos comícios e nos debates, tem ficado cada vez mais difícil para os gerentes de publicidade das campanhas influenciar a forma como a mensagem dos seus candidatos é disseminada, devido à entrada dos "jornalistas cidadãos" no cenário.
"Os comitês de campanha trabalham cada vez mais arduamente no sentido de prevenir desastres, mas, inevitavelmente, haverá rachaduras na fachada", afirma Fowler, uma entusiasta que desembolsou dinheiro para participar continuamente da cobertura da campanha desde o final de dezembro passado. "Antigamente, com muita freqüência, os candidatos falavam de uma forma para uma platéia e de outra totalmente diferente para um outro grupo de eleitores. Mas, devido à tecnologia, creio que agora tudo isso ficará registrado", afirma ela. Atualmente os políticos enfrentam a assustadora possibilidade de que praticamente toda ação ou comentário improvisado possa ser gravado digitalmente e disseminado amplamente pela Internet.
Foi a presença de Fowler em um evento para arrecadação de verbas, em São Francisco, em abril, o fator responsável para que a campanha de Obama atingisse o seu patamar mais baixo até o momento. A gravação feita por ela dos comentários do candidato sobre como os "amargos" habitantes da Pensilvânia "agarram-se", como consolo, às armas e à religião, ressaltou aquilo que os críticos denunciaram como elitismo.
Fowler diz que à época esperava ser capaz de conciliar o seu entusiasmo pessoal por Obama com a sua reportagem. Ela ficou indecisa vários dias, sem saber se divulgava aquilo que o senador por Illinois dissera perante uma platéia de 400 pessoas, embora atualmente sinta pouco remorso. "Ele estava confirmando os piores estereótipos dos californianos da classe média alta a respeito dos eleitores da classe trabalhadora", diz.
Mais recentemente, esta mãe de Oakland estava em Dakota do Sul para registrar o último dia da campanha de Hillary Clinton nas primárias, quando Bill Clinton parou para conversar com uma multidão. Respondendo a uma pergunta dela sobre o áspero perfil publicado recentemente por uma revista, ele chamou o jornalista responsável pelo artigo de "um sujeito viscoso" e "um indivíduo desprezível" - comentários que ricochetearam pela Internet.Inevitavelmente, os dois furos de Fowler geraram um debate entre os círculos jornalísticos no sentido de determinar se é correto publicar todos os comentários feitos de improviso, e se algum político é capaz de sobreviver a tal escrutínio constante.
Marc Cooper, o editor dela no "Huffington Post", dá pouca importância a tais argumentos. "A nova realidade para os políticos é que é melhor demonstrarem clareza quanto àquilo que são, ou então acostumarem-se a mentir a todo o momento".
A parte do site do "Huffington Post" destinada às reportagens dos voluntários - a "Off The Bus" - deixa claro que é uma virtude o fato de os seus colaboradores serem pessoas comuns, que não fazem parte do grupo de jornalistas tradicionais que viajam com os candidatos.
"Os jornalistas que embarcam no mesmo ônibus que o candidato estão sujeitos a bate-papos amigáveis. Agora os manipuladores da mídia aprenderam a fornecer 'umas migalhas' aos blogueiros favoráveis a fim de que estes influenciem o debate na Web. Eles não desejam alguém como eu, que está fora do círculo de controle", afirma Fowler. Após meio ano de repousos breves em hotéis baratos e longas viagens de carro entre os comícios dos candidatos, Fowler traz as cicatrizes de um jornalista de campanha mais tarimbado.
Grande parte do seu idealismo desapareceu, à medida que ela observava os candidatos democratas de uma distância relativamente curta.
E embora ainda se defina mais como cidadã do que como jornalista, ela desistiu do seu antigo entusiasmo partidário. "Fiquei muito mais desvinculada, objetiva e fria", explica Fowler. "Tornei-me a clássica jornalista cética".
fonte: Financial Times [via UOL]
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