3.8.08

A única causa de mim mesmo

Curiosa sensação fisgou-me no exato instante em que toquei a virgindade com minhas botas barrentas. Tudo era absolutamente admirável e absolutamente assustador. Duas forças contrárias e idênticas me impeliam, uma para dentro, outra para fora. Devassar a virgindade, percebi, é tão fascinante quanto temerário.

Mas o primeiro passo estava dado, meus dois pés estavam já firmados no solo virgem e esse era o extraordinário divisor de águas. Intuí, pela primeira vez, a existência de um estado anterior a todos os seres, anterior ao próprio Deus. O Deus de que tanto falavam era um Deus criado pelo tanto falar, cheio de ira e amor, portador de espada e lágrima. Quando falamos de Deus, estamos criando um Deus. Naquele estado, porém, Deus não é criatura nem criador, simplesmente não é, como nós também não somos. O nada é tudo, e Deus e homens e planetas e sóis, o mesmo inusitado mistério.

Intuí ainda, e isso foi determinante para que eu superasse a força que me impelia para fora, que apenas me diluindo naquela delirante comunhão eu poderia encontrar-me tal como sempre desejei: despojado de tudo que me é alheio. Ali nem sequer Deus poderia me tocar, embora eu estivesse inteiramente imerso Nele.

Ali eu era a única causa de mim mesmo.

Alysson Amorim, no blog Amarelo Fosco.

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