30.8.08

O futuro da imprensa é muito incerto

"Eu já fui repórter de jornal. Comecei minha carreira no The New York Times, cobrindo o plantão da delegacia de polícia de Newark, em 1959", escreveu o historiador Robert Darnton, 69 anos, num artigo publicado em junho no The New York Review of Books. Em 1968, Darnton ingressou na Universidade Princeton e fez carreira como um dos maiores historiadores americanos do século XX. Atualmente diretor da Biblioteca da Universidade Harvard, ele concedeu a ÉPOCA uma longa entrevista sobre o futuro do livro e das bibliotecas na era da internet (que poderá ser lida a partir deste sábado na edição impressa). Selecionamos para o site as impressões de Darnton sobre as novas atribuições da profissão repórter e sobre o futuro do jornalismo.

ÉPOCA – O senhor começou sua carreira nos anos 1960 como repórter do jornal The New York Times. Como vê o papel do jornalismo na era da Internet?

Robert Darnton – Os jornais enfrentam uma severa crise financeira em todo o mundo. O jornal tradicional está perdendo publicidade, sua principal fonte de receita, e também leitores, que preferem se informar lendo as versões on-line do The New York Times, por exemplo. A reação do jornal é vender publicidade on-line. Mas as contas não fecham e os lucros caem. A conseqüência é a demissão de repórteres e a redução do total de correspondentes estrangeiros. É o que está acontecendo no Washington Post, no Chicago Tribune e no New York Times. Eu não acho que o Times vai falir. É um exemplo de como a nova mídia afeta a tradicional.
ÉPOCA – O mesmo fenômeno acontece no Brasil?
Darnton – Eu adoro o Brasil! Já fui várias vezes e conheço bem sua imprensa. Vocês têm grandes jornais, como O Globo e a Folha de S.Paulo. No entanto, era de esperar que ocorresse o mesmo. Trata-se de um fenômeno mundial. Os jornalistas agora precisam escrever suas reportagens, mas também a versão on-line e um blog, além de gravar um vídeo. A coisa não tem fim, pois eles precisam reescrever tudo a cada 30 minutos, se não fica desatualizado. A vida não está fácil para os repórteres de jornal.
ÉPOCA – O que fazer?

Darnton – O futuro da imprensa é muito incerto. Se a imprensa escrita está sofrendo, não é porque a imprensa on-line é muito melhor – em sua maioria ela é composta por amadores que participam de blogs e semeiam informações erradas. O lado positivo é que surgiu um espírito “faça você mesmo” no jornalismo caseiro. O negativo é que o profissional cuidadoso e experiente, aquele que cobre temas específicos e importantes, está perdendo o emprego. Estamos passando por um período de transição e eu ainda não sei o que o futuro nos reserva. É óbvio que o futuro do jornalismo será eletrônico. Espero que diários de qualidade como O Globo e a Folha de S. Paulo sobrevivam. Mas, para tanto, terão que criar formas híbridas de comunicação, por exemplo, usando dispositivos portáteis. Não vai ser nada fácil.

ÉPOCA – Por que o senhor não se fia em informações de jornais históricos quando pesquisa para seus livros sobre a França do século XVIII?

Darnton – Apesar de ser uma importante fonte de informação, os jornais são coleções de reportagens sobre acontecimentos. Não são janelas através das quais podemos ter uma visão direta dos eventos do passado. Determinado artigo pode ser acurado, mas, como qualquer reportagem, é escrito de acordo com convenções narrativas que são arbitrárias. Por exemplo, a escolha de qual informação colocar em primeiro lugar no artigo ou a forma como se usam as frases dos entrevistados, tudo isso distorce a realidade dos fatos. A redação jornalística revela apenas uma versão do fato.

ÉPOCA – Esse é um problema do jornalismo impresso?

Darnton – O mesmo acontece com a versão televisiva. São versões concorrentes do que realmente aconteceu. Mas nenhum evento corresponde exatamente ao que foi reportado. Portanto, quando leio jornais de 200 anos atrás, que obviamente são muito diferentes dos de hoje, tenho consciência de que muitas vezes não passam de cartas impressas. Um jornal de antes da Revolução Francesa (1789) parece um panfleto. A primeira história é sempre sobre algo em algum local remoto, como Constantinopla. A seção seguinte trata de outras coisas um pouco menos distantes, até que finalmente se chega a Paris, e é a última coisa que se lê no jornal.

fonte:
Época

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