25.10.08

Amor de segunda-feira

Só os homens e mulheres que têm amantes nas firmas e nas repartições amam a segunda-feira.

Eles amam este dia como os seus próprios objetos e alvos do desejo.

Segunda é o dia sagrado dos amantes de escritórios, redações, bancos, editoras, almoxarifados, restaurantes, varejões Ceasas, tomate e maravilha como na canção do Arnaldo Baptista...

Sim, alguém levantaria a mão, nessa exata hora, com ou sem moralismo, pedindo a palavra, e diria, aproveitando as obviedades do centenário machadiano: e aos traídos a velha batata quente da chapa da existência!!!

Depois de esperarem o sábado e o domingo, resignados ou aos coices internos no juízo, os amantes de repartições ou firmas voltam assobiando aos seus postos, mesmo nas funções mais duras e escravas, mesmo que a burocracia lhes reservem apenas o lirismo comedido antes do almoço no quilo barato.

As criaturas que têm amantes nas empresas seriam uma incógnita para o velho Karl Marx , cada dia mais atual com a quebradeira dos mercados: seriam a quintessência da mais-valia, uma vez que retornam felizes à labuta e assim produzem mais ainda de forma lindamente alienada? Seriam uma ressaca a mais, esse belo antídoto ao kapital, levando-se em conta que os beijos e amassos na escada representam prejuízos na cadeia econômica?

Noves fora as reflexões marxistas (o viejo Karl mesmo quebrou a corrente e a classe ao ter como amante a empregada doméstica), reparem no sorriso de segunda-feira do homem ou da mulher que têm amantes na firma!

Eles batem o relógio de ponto ou passam o crachá na catraca como quem alcançam o ponto G ao primeiro minuto de jogo.

Eles fazem aquelas reuniões chatíssimas, aquelas em que as pessoas se anulam e conjugam no plural das corporações –NOSSA EMPRESA, NOSSAS AÇÕES, NOSSO PREJU, NÓS DA FIRMA!- com um sorriso acima do bem e do mal do kapitalismo.

Esse amor, seja que diabo for, não deixa de ser lindo, pois quebra de alguma maneira a corrente burra do trabalho e dos dias, como diria o velho Hesíodo. Alguém se dirige ao matadouro pensando em algo que não seja somente enricar o patrãozinho branco e reacionário! Porque um beijo na boca na escada, por mais que seja na firma, sítio do antitesão por excelência, vale mais do que a mais rentável das ações de um homem de negócios.

Mas não politezemos o beijo, sem ideologia para o simples e inadiável desejo do pau duro ou da buceta molhada –essas inegociáveis mercadorias da natureza, essas anticommodities do mundo e de Deus, seja de que religião comungue a criatura da firma.

Só queria dizer que hoje é segunda e alguém está feliz com essa maldita folhinha do calendário.
Sexta-feira a história já será outra de novo. Até lá teremos futebol, tédio de graça, contas a pagar, almoços a quilo, noites mal-dormidas e amores a rodo.

Xico Sá, no Blônicas.

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