30.1.09

De frente para o criminoso

PERDÃO DE MÃE "Minha filha Karen, de 16 anos, foi encontrada morta na casa do namorado, Jean, que eu considerava como um filho. Ele mentiu, mas a perícia comprovou a morte por asfixia. No encontro, conversamos sobre o mal que ele causou. Acabei perdoando-o, pois vi um rapaz consumido pela própria culpa. Ele foi condenado e ainda cumpre pena." Márcia Garcia, 46 anos, de Porto Alegre

O desejo de desforra, a sensação de impotência, o medo de passar por tudo mais uma vez – o turbilhão emocional que atormenta as vítimas de violência é bem conhecido dos brasileiros. A mente dos agressores é um pouco mais obscura. Quantos deles são capazes de se imaginar no lugar das pessoas a quem agrediram e se arrepender sinceramente? Nos últimos três anos, um projeto piloto do Judiciário brasileiro tem dado à vítima a oportunidade de ser ouvida pelo criminoso. A experiência mostra que esse tipo de programa, conhecido como Justiça Restaurativa e já existente há duas décadas em outros países, ajuda a diminuir o ressentimento e o sentimento de impotência de quem sofreu a violência. O encontro pode ser, também, uma maneira de impedir que o desejo de vingança provoque uma espiral de violência.

Os diálogos entre vítimas e delinquentes têm um roteiro predefinido, garantido por um mediador, e só acontecem se as duas partes toparem. De frente para o agressor, a vítima conta como sua vida mudou a partir do crime e, por sua vez, ouve as razões do outro. Ambos devem repetir o depoimento que ouviram para comprovar que entenderam o recado. Familiares das vítimas e dos criminosos são convidados para participar e também podem falar. Não raro os participantes desenvolvem uma empatia mútua depois do diálogo. "Achei que ia encontrar duas pessoas malignas, dois bandidos sem solução", afirma o estudante gaúcho Yuri Machado, de 21 anos, que conheceu os jovens que o roubaram e agrediram na rua em que mora. "Vi seus pais envergonhados com a situação e rapazes que se mostraram genuinamente dispostos a mudar de vida", ele diz.

Embora relatos de perdão e reconciliação sejam frequentes, esses não são os objetivos principais do encontro. Se tiver sido condenado, o agressor continuará preso mesmo depois de ser perdoado pela vítima. "O importante é fazer com que o criminoso tenha consciência do que fez e se responsabilize por todos os danos causados", diz o juiz Egberto de Almeida Penido, coordenador do Centro de Estudos de Justiça Restaurativa da Escola Paulista da Magistratura. A maioria das vítimas descreve a experiência como um alívio. "O encontro auxilia as vítimas a sanar as dúvidas pendentes com relação ao crime e ajuda a controlar a insegurança que as acomete", diz Cinara Moraes, psicóloga da Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre, que acompanha jovens infratores.

trecho de matéria na Veja.

fiquei meio chapado ao ler esta reportagem, especialmente c/ o relato da mãe da adolescente morta. objetos de uma série de expressões negativas, os cristãos não são reconhecidos nem de longe (e muito menos de perto) pela capacidade de perdoar.

todas as comunidades têm histórias de incidentes que provocaram rupturas definitivas. pessoas definham consumidas pela mágoa, mas não abrem a guarda. tampouco o coração...

em eventos que realizei em algumas cidades, vinha gente me contar que o pastor fulano sequer pisava no mesmo lugar em que estava o bispo beltrano. a biografia do (p)edir macedo tem um trecho que mostra o desprezo mútuo entre ele e r.r. soares.

na gravação recente de um programa de tv, malafaia tentou puxar assunto c/ um amigo p/ falar mal do caio fábio pela zilionésima vez. jornais noticiaram que se o bispo waldemiro entrasse por uma porta o missionário sairia por outra.

se é verdadeiro aquele trecho que condiciona o perdão de nossas faltas ao perdão que concedemos, tamo lascado. vão sobrar vagas no céu. em compensação, o inferno terá uma concentração de crentes nunca imaginada. todos brigando p/ ver quem será o presidente do conselho infernal de pastores. =)

7 comentários:

Roger disse...

O pior de tudo Pavarini, é que "povo e sacerdotes são iguais"... essas realidades eu mesmo já vivi na pele.

Cristãos tratam o perdão como um mandamento, mas que não envolve a verdade do coração e da alma, ou seja, "é da boca pra fora"...

Já cansei de ver reuniões onde, dizia-se, "este é o momento de perdoar", e acontecia o "perdão mecânico" do tipo, "se não o fizer não posso participar da Ceia", como se houvessem "momentos oficiais de perdão"...

Mas, um perdão mecânico, frio e superficial. Cristãos por hábito, não limpam suas feridas, cobrem-nas com "gazes" (e aqui cabe um duplo sentido)...

Infelizmente não entendemos ainda que amar e perdoar são dois verbos dos mais difíceis, e que conjugá-los requer muita vontade, renúncia, e muitas vezes dor.

Quem perdoa, de verdade, sempre precisa pagar uma parte da dívida de quem o prejudicou. E o amor, que é sofredor, quem sabe, pode começar assim.

Leone Lacerda disse...

Acho que isso explica o pedido de "amar ao próximo como a nós mesmos". Jesus já conhecia nosso egoísmo e sabia que se colocássemos o outro no nosso lugar, talvez amaríamos essa pessoa como nos amamos.

Mas eu não exigiria que um pai que teve sua filha estuprada perdoasse o estuprador. Pimenta nos olhos dos outros às vezes também arde.

Roger disse...

É verdade Leone, o único que pode exigir alguma coisa é Deus mesmo...

E Ele disse que amar e perdoar, eram mandamentos e não sugestões...

Como pode isso, como por exemplo, no caso em que você citou? Só Ele pode responder...

A isso eu chamo de "verdadeiro" milagre...

Essa semana mesmo ouvi um homem que pedia esmolas, por ser ex-presidiário, esteve preso por 18 anos, pelo assassinato do violentador de sua filhinha pequena, que a violentou, matou e esquartejou (segundo ele)...

Eu não sabia o que dizer ao homem, queria ajudá-lo, mas vi o que a dor fez com ele, e foi doloroso demais...

Se existem milagres (e eu creio), o amor e o perdão, são os maiores de todos!!!

Mas quem pode suportar essa verdade?

Eliézer disse...

O meio evangélico só se importa com a imagem, por isso rotula tudo que vê. O evangelho é vivido como um show de performances, para fora do ser e não para dentro como é a proposta de Jesus nos evangelhos.

Criam regras e métodos para emular aquilo que deveria ser a verdade da vida do cristão. Por isso quando a "receita" falha -e vive falhando- a igreja esconde o fracasso, asselhamdo-se àquele tapete velho para onde se varre toda a sujeira que vai acumulando com o passar do tempo.

Mas se Deus ouvir a oração dos crentes que pedem para que Ele restaure a nação, que se preparem: a primeira fossa que vai vazar para ser limpa é o da igreja ! Deus sempre começa as obras de restauração pela própria casa.

Como disse Jesus, muitos de outras nações nos precederão no Reino. E a cada dia que passa vejo que isso se confirma.

Pavarini disse...

leone e roger,

nem ouso pensar na hipótese de ter de perdoar uns lances desse calibre. meu grau de (falta de) santidade sequer me permite imaginar isso.

o triste é ver isso acontecer de forma regular nas igrejas. qtos zilhões de pessoas trocaram de igreja pq se desentenderam c/ outras? basta que outro incidente ocorra na nova comunidade p/ o cara se transformar num saltimbanco. literalmente sem graça. =)

Roger disse...

Talvez Pavarini, apenas talvez, uma forma de evitar esse "êxodo amargurado" fosse comerçarmos nossos cultos, como começam as reuniões do AA...

"Boa noite, meu nome é fulano, eu sou pecador, sou um mentiroso, invejoso, fofoqueiro...", rs

Pelo menos não teríamos um patamar de expectativas tão alto, uns com relação aos outros...

Mas, não é bem assim que nos apresentamos...

Pavarini disse...

excelente, roger.

com minha mente malevolamente pecadora, imaginei quanto tempo teria de ser reservado p/ as apresentações em congressos de pastores de algumas igrejas... :P

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