Fiquei surpreso com uma declaração de Ronaldo sobre seu filho Ronald, de 9 anos, na sábada [sic] da Folha. Leia:
“Prefiro que o Ronald seja criado na Espanha. A mãe dele também prefere. Aqui no Brasil, as crianças da idade dele, de 9 anos, já tem um palavreado malandro. Lá, ele não fala nenhum palavrão. É um doce de menino, praticamente um europeu.
Ouviu-se um grito na platéia: “Ele é brasileiro!”Ronaldo continuou:
“É brasileiro, mas eu prefiro que tenha amiguinhos europeus, sem a malandragem dos amiguinhos brasileiros. A gente quer sempre o melhor pros filhos, e eu, podendo escolher, prefiro que ele tenha educação europeia.”
Ronaldo já foi patrulhado várias vezes em função de atitudes e declarações, numa crítica alimentada pela uma visão preconceituosa sobre nossos craques do futebol, sempre apontados como pessoas “sem preparo” para o sucesso e o dinheiro.
Acho que ele tem toda razão quando diz que “a gente quer sempre o melhor para os filhos…”
Não discuto o direito de dar aos filhos a melhor educação possível — inclusive fora do país. Conheço muita gente respeitável que faz a mesma coisa. Outros fariam — se pudessem.
Mas não entendo a felicidade com que ele diz que seu filho é “um doce de menino, praticamente um europeu.”
Com isso, ele quer dizer que se o filho fosse “praticamente brasileiro” não poderia ser um “doce de menino?”
Ronaldo aponta uma “malandragem de amiguinhos brasileiros” que, de acordo com suas observações, não existe entre “amiguinhos europeus.”
São frases erradas e preconceituosas, incompatíveis com uma estrela de 185 milhões de brasileiros, aí incluidos muitos “amiguinhos” que ele quer manter longe da boa educação do pequeno Ronald.
A identificação do brasileiro de forma negativa, como um malandro, isto é, um sujeito pouco confiável, é uma construção colonizada, que se tornou sucesso mundial com Zé Carioca, personagem de Walt Disney.
Imaginar que entre “os amiguinhos europeus” não existam “malandros” é alimentar uma visão de inferioridade incompatível com o talento maravilhoso que Ronaldo exibe no campo de futebol e nos grandes dribles que já deu na vida.
Ao longo de uma carreira de vitórias, ele sempre mostrou muita elegância nas jogadas, oportunismo para aproveitar chances de marcar — e raramente perdeu um gol. Mas, como lembrou aquele grito na platéia, Ronald é “brasileiro.”
Ninguém é capaz de negar suas origens, mesmo que queira. Saber enriquecê-las com outras culturas e outras experiências é uma das delícias da vida. Concorda?
Paulo Moreira Leite, no site da Época.
17.5.09
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2 comentários:
e que dianta ter a educação dos europeus se esta foi construida com as riquezas ROUBADAS na colonizacao desumana que eles fizeram na america latina, africa, ásia??
Oras, os europeus estão crescendo e se tornando educados, mas ao mesmo tempo não abrem maão de suas riquezas e glorias para reconstruir o mundo pobre e mal educado dos latinos, africanos e asiáticos...
entao é melhor ser mal educado e tentar mudar o panorama aqu, do que ser um educado sem amar o proximo como tem sido muitos desta geração europeia que produz carros de luxos, palacios, avioes, jogadores de futebol multimilionarios... tudo um lixo na verdade...
É tão preconceituoso o Ronaldo achar que no Brasil seu filho seria obrigatoriamente um malandro, quanto achar, como o Carlos que comentou antes de mim, que todo europeu não ama o próximo e tudo o que a Europa produz é lixo... Nem tanto ao mar, nem tanto à terra.
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