Em sua opinião, portanto, apesar das aparências, o mundo tem-se tornado cada vez mais cristão, ainda que a Bíblia não seja mais lida?
Sim. E, de certa forma, esse fato torna o fenômeno bem mais paradoxal, pois é mais fácil resgatarmos princípios bíblicos quando não sabemos que o são. O niilismo moderno é uma mentira. Após a Segunda Guerra e a dissolução da URSS, ou seja, com a queda do regime comunista, quando nossos intelectuais julgaram liquidado todo e qualquer princípio absoluto, estavam errados: a vitimologia ou a defesa das vítimas se tornou sagrada: é o princípio absoluto. Ninguém jamais atacará tal princípio. Então, podemos dizer que todos temos essa crença cristã.
Alguma vez já viram um desconstrucionista ou um foucaultiano fazendo o tipo de genealogia que Nietzsche tinha em mente? Ele visava a uma desconstrução do Cristianismo, por ele entendido – de forma acertada – como a defesa das vítimas. Nossos niilistas modernos querem desconstruir tudo, exceto a defesa das vítimas, causa por eles abraçada. Silenciosamente, rejeitam o Nietzsche pró-nazismo. Constituem, na verdade, um tipo muito peculiar de niilistas; negam tudo, exceto a defesa da vítima. Noutras palavras, não poderiam ser mais cristãos, embora, é claro, neguem o Cristianismo, numa autocontradição cada vez mais óbvia.
René Girard, em Um longo argumento do princípio ao fim [via blog do Filipe Liepkan].
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Um comentário:
Eu qualificaria essa contradição como paradoxo. Ainda cito Caputo:
"Derrida disse uma vez que 'a desconstrução [...] não é negativa, mesmo que tenha sido várias vezes interpretada como tal apesar de todo tipo de avisos. Para mim, ela sempre acompanha uma exigência afirmativa, eu até mesmo diria que ela nunca prossegue sem amor' A desconstrução não dá nem um só passo sem amor; ela sempre segue ‘nos passos’ do amor, seguindo o chamado do amor. O que ela ama? O impossível, o indesconstrutível, o que vem, o evento. Desconstrução é afirmação, a afirmação do impossível, da vinda do evento. " "What Would Jesus Deconstruct? The Good News of Post-modernism for the Church", de John Caputo, página 78.
abraços!
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