Estátua de Alan Turing no museu de Bletchley Park, na Inglaterra.
O governo britânico pediu ontem desculpas pelo tratamento "chocante" ao qual o matemático Alan Turing, um dos cientistas mais reverenciados do país, foi submetido para coibir sua homossexualidade, e que o levou ao suicídio em 1954.
Surpreendente, o pedido resulta de uma petição on-line que, em pouco mais de um mês, atraiu 31,3 mil assinaturas e desenterrou na mídia a história do pai da inteligência artificial.
"Turing foi um matemático brilhante, famoso por decifrar os códigos da [máquina de criptografia] alemã Enigma. Não é exagero dizer que, sem sua notável contribuição, a história da Segunda Guerra poderia muito bem ter sido outra", diz o premiê Gordon Brown em comunicado no site do governo.
"A dívida de gratidão que temos torna mais horrível ainda a forma como ele foi tratado." Inédito para um governo britânico, Brown admite que o tratamento com hormônios a que Turing foi submetido por dois anos motivou seu suicídio.
Ser gay era crime então, e a prisão era a alternativa às injeções que lhe deformaram o corpo e o deprimiram -antes, o matemático já tinha perdido a autorização para atuar em projetos secretos porque gays eram um "risco à segurança", por serem alvo de chantagem. Como seu trabalho era sigiloso, ele nunca foi considerado herói de guerra em vida como é hoje.
"Embora não possamos voltar o relógio, o tratamento foi profundamente injusto, e estou satisfeito com a chance de dizer o quão profundamente lamento, e todos lamentamos, o que lhe aconteceu", diz o premiê, que avança em uma reparação coletiva: "Alan e milhares de outros condenados sob a lei homofóbica da época foram tratados de modo terrível. Milhões viveram com medo".
Autor surpreso
A retratação vem dez dias depois das celebrações dos 70 anos da Segunda Guerra --o código decifrado por Turing possibilitou aos britânicos interceptar mensagens e atacar os submarinos de Hitler, revertendo a vantagem nazista.
Mas surpreendeu o autor da petição, o programador britânico John Graham-Cumming, que se assustou com um telefonema do premiê na véspera. Quando iniciou o abaixo-assinado no site do governo, ele só queria chamar a atenção para o assunto e a falta de financiamento ao museu feito na casa onde Turing trabalhou.
A Folha trocou e-mails com Graham-Cumming durante sua empreitada. "Acho que a petição capturou o imaginário porque o público percebeu que perdeu um grande homem para o preconceito, e era hora de consertar o erro", escreveu à repórter há uma semana, dizendo-se "apenas sortudo" por seu pedido receber atenção.
Ontem, disse estar sem palavras. "Fiquei muito surpreso em receber essas desculpas tão rápido e tão enfaticamente, e mais surpreso ainda quando o próprio Gordon Brown me ligou no celular", comentou. O prazo da petição era janeiro de 2010. "Acho que o próprio premiê ficou chocado ao descobrir a história de Alan Turing."
fonte: Folha de S.Paulo
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