Da doença que quase lhe custou a vida no ano passado, José Saramago exibe poucos resquícios, como uma magreza ligeiramente mais acentuada que a habitual. A língua, porém, continua ferina e, prestes a completar 87 anos (em novembro), o escritor português comemora o lançamento de um novo livro, Caim (Companhia das Letras, 176 páginas, R$ 36, à venda a partir de segunda-feira), disparando críticas a torto e a direito.
Primeiro, contra um desafeto antigo, Deus - se em O Evangelho Segundo Jesus Cristo (1991) apresentou sua provocativa visão do Novo Testamento, em Caim Saramago volta aos primeiros livros da Bíblia, do Éden ao dilúvio, ao mostrar a jornada do personagem principal, depois de assassinar seu irmão Abel. Em seu trajeto, Caim amaldiçoa o amargo destino reservado por Deus.
Nesta semana, quando esteve em Turim para o lançamento de sua obra anterior, O Caderno (seleção de textos divulgados em seu blog), José Saramago revelou seu desprezo pela crença dos religiosos, em especial os católicos. Ele chamou o papa Bento XVI de "cínico" e disse que a "insolência reacionária" da Igreja precisa ser combatida com a "insolência da inteligência viva". "Que Ratzinger tenha a coragem de invocar Deus para reforçar seu neomedievalismo universal, um Deus que ele jamais viu, com o qual nunca se sentou para tomar um café, mostra apenas o absoluto cinismo intelectual desta pessoa."
Na Itália, o escritor aproveitou para novamente criticar o primeiro-ministro Silvio Berlusconi. "Assim como a eleição de Barack Obama foi um sinal de esperança para o mundo, a sentença da Corte Constitucional contra a imunidade de Berlusconi é um sinal de esperança para o povo italiano, que deve retomar seu caminho", afirmou o escritor.
Ele se referiu à queda da Laudo Alfano, lei que garantia imunidade penal aos quatro maiores cargos do governo da Itália, inclusive o primeiro-ministro, e que foi derrubada pela Justiça na semana passada. Com isso, Berlusconi voltará a responder pelos processos nos quais é citado.
É possível, portanto, que Saramago continue desferindo seus golpes verbais amanhã, em Penafiel, cidade portuguesa que lhe fará homenagem e onde ocorre o lançamento oficial de Caim. Sobre essa obra, que foi apresentada à imprensa mundial em Frankfurt, durante a Feira do Livro, Saramago respondeu, por e-mail, às seguintes do Estado, também sob um certo mau humor.
A ideia de 'Caim' surgiu há alguns anos, mas o senhor já disse que a história só começou a tomar forma em dezembro do ano passado. Por que justamente nessa época?
Não perguntamos a uma maçã por que amadureceu naquele momento e não noutro. Neste sentido o escritor é uma maçã, tem uma ideia, desenvolve-a pouco a pouco, até que sente que está pronto para começar a escrever. O que há de mais complicado nesse processo se passa no subconsciente, um subconsciente que trabalha por conta própria e só depois apresenta os resultados.
Em outra entrevista, o senhor disse também que utiliza seus romances como veículo para reflexão sobre a vida. Em que aspecto a religiosidade é cabível na reflexão proposta por 'Caim'?
Caim é um livro escrito contra toda e qualquer religião. Ao longo da História, as religiões, todas elas, sem exceção, fizeram à humanidade mais mal que bem. Todos o sabemos, mas não extraímos daí a conclusão óbvia: acabar com elas. Não será possível, mas ao menos tentêmo-lo. Pela análise, pela crítica implacável. A liberdade do ser humano assim o exige.
O senhor acredita que o tom antirreligioso de 'Caim' provocará semelhante celeuma como aconteceu com O Evangelho Segundo Jesus Cristo? Pergunto isso porque, em 'A Viagem do Elefante', são postas a nu muitas das hipocrisias da Igreja Católica - os católicos já se acostumaram com José Saramago?
Eu não gostaria mesmo que se acostumassem, mas espero, se forem sensatos, que não se metam com um livro que não lhes diz respeito.
Se O Evangelho Segundo Jesus Cristo despertou a ira de parte da comunidade católica mundial quando lançado, o senhor acredita que 'Caim' provocará o mesmo entre os religiosos judeus?
É possível. Será necessária uma argumentação muito retorcida para explicar e justificar os atos de barbárie de que a Bíblia está repleta. Em todo o caso, tenho a pele dura. Nada do que possam dizer me surpreenderá.
O senhor ainda sente necessidades de ajustar contas com Deus, mesmo acreditando que ele só existe na cabeça das pessoas?
Deus não existe fora da cabeça das pessoas que nele creem. Pessoalmente, não tenho nenhuma conta a ajustar com uma entidade que durante a eternidade anterior ao aparecimento do universo nada tinha feito (pelo menos não consta) e que depois decidiu sumir-se não se sabe para onde. O cérebro humano é um grande criador de absurdos. E Deus é o maior deles.
fonte: Estadão
dica do Jarbas Aragão
recomendo a leitura dos comentários. olha o naipe de um deles: "se o Saramago for arder no fogo perpétuo, gostaria de estar ao lado dele ! Acho que já tenho um lugar reservado por lá! Já pensou a tortura de passar a eternidade no Paraíso, ao lado de um evangélico?"
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17 comentários:
Quem quiser, leia "DEUS E O ATEU"
http://merapalavra.blogspot.com/2009/01/deus-e-o-ateu.html
Abraços!
Saramago, apesar da rebusquez de suas obras fundamenta seu rancor ateísta com idéias parcas e infantis sobre religião, disparando argumentos que não remetem em nada ao arrojo de seus textos. Negligencia a importancia das religiões na formação e instituição de valores éticos e morais em diversas sociedades,fala em "religião" quando na verdade são exclusivamente os cristãos os alvos de seus mais ácidos ataques. Fundamentalismo ateísta está em voga, mas nem Dawkins seria capaz de defender suas idéias com esses argumentos pobres e preconceituosos.
Esse cara é doente!
E eu que achava o Dawnkins infantil nos seus argumentos antireligião!
Fica um conselho (e na mais além disso) aos teólogos e pseudo-teólogos, aos arautos da religião e os que se sentem na missão de "defender" Deus: esqueçam os argumentos de Saramago, deliciem-se com a sua fenomenal literatura!
Lamento que um homem tão inteligente não perceba a Biblia! Mas são atitudes como as do sr. Dr. Prémio nobel josé saramago que ajudam a provar a existência de Deus, pois com tantos assuntos e temas para tratar nos seus livros, o sr. Dr.insiste no tema Deus? Não será que é um tema que bem lá no fundo o incomoda? Sempre ouvi dizer que quando algo não nos diz nada, desprezamos. Se falamos é porque nos afecta! Não será que é o que acontece com o sr. Dr.?
Ele é muito bom kra!!!
poxa gente q mal há na liberdade da crença dele?
pensei q a galrera ia aproveitar o espaço e comentar sobre a obra e não a crença do kra!!
ancioso para ler Caim!
"Deus não existe fora da cabeça das pessoas que nele creem."? Parece que esse mesmo Deus não sai da cabeça deste angustiado escritor.
Observem:Saramago não está simplesmente negando a existência de Deus, mas se afirmando como homem(-escritor). Só isso. Livro vende, ser polemista vende. Acordem!
Mas ainda prefiro um bom ateu, a um chato fanático. O primeiro obedece...e o segundo: assassina.
E eu que achava o Dawnkins infantil nos seus argumentos antireligião![2]
hahaha, que triste, olha o que o fanatismo não faz com caras até inteligentes
Nuss, a Alzira matou a charada.
É isso.
Cristina
Como homem de fé eu diria que o sr. Saramago é produto de uma religiosidade tacanha, no qual ele e a maioria de nós fomos criados. Ele é a antítese dela. Neste sentido sua crítica é perfeitamente válida e construtiva. Somos o que comemos.
Saramago é um fundamentalista ilustrado. Os cristãos precisam ler e refletir criticamente as magníficas obras desse notável escritor, que soam a profecia sobre a religião nesses tempos de hipocrisia.
Tenho pena de José Saramago, pois ele não sabe que a palavra que ele cretica agora,o irá julgar um dia mais tarde.Não merece muita impotancia só espero que Deus tenha compaixão dele.
Parece o Eustácio (Coragem, o Cão Covarde)!
"Mas ainda prefiro um bom ateu, a um chato fanático. O primeiro obedece...e o segundo: assassina."
E os soviéticos, como bons ateus chatos fanáticos obedeciam e assassinavam? ACERTEI? URRUL!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Saramago diz: "Ao longo da História, as religiões, todas elas, sem exceção, fizeram à humanidade mais mal que bem. Todos o sabemos, mas não extraímos daí a conclusão óbvia: acabar com elas. Não será possível, mas ao menos tentêmo-lo. Pela análise, pela crítica implacável. A liberdade do ser humano assim o exige."
Digo eu: A anti-religião não seria, em si mesma, apenas mais uma religião a provocar destruição e mazelas às vidas humanas?
Lógica por lógica, fico com a multiforme graça de DEUS, que abençoa até mesmo o turrão Saramago com mais algum tempo de vida, até que tenha ele mesmo seu encontro co DEUS.
Abraços!
sinceramente, não sei quem é pior, se Saramago ou Paulo Coelho. Mas uma coisa eles tem em comum, sobrevivem dos incautos.
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