9.1.10

Garçom, desce um conhaque e um porrete

Eu sou suspeito pra falar. Não tenho filhos (nem filhas), tampouco posso ser chamado de moralista ou conservador, não só pelas minhas conhecidas opiniões, quanto pelo meu passado, que me condena bastante. Mas, ainda assim, eu acho que certas coisas têm limite, e as novas gerações às vezes passam do ponto. Foi a conclusão a que eu cheguei diante do relato do Abreu, companheiro de muitas bebedeiras, que chegou com ar desolado no bar nesta sexta-feira. No lugar do chope habitual, ele pediu um conhaque. Para quem o conhece, era um sinal claro de que ele não estava num bom dia.

Desolado, ele contou a desventura por que passou com a Marianinha, sua filha mais velha, que numa conversa franca e direta, lhe expôs suas intenções de dormir com o namorado em casa, dividindo quarto, cama e fluidos corporais. Pro Abreu e pra esposa, foi um choque. Ele, militar aposentado. Ela, coordenadora da Congregação Mariana da Igreja. Pelos perfis já deu pra sentir que foi muita modernidade de uma vez só.

Mas ele não se deixou abater. Num esforço de tolerância e compreensão, o Abreu fez um genuíno esforço para aceitar que, hoje em dia, os tempos são outros. Que vivemos num ambiente democrático e sem tabus, no qual as mulheres estão conquistando a independência financeira e a liberdade para decidir sobre a própria vida e sobre o próprio corpo. Também pesou para a rendição do nosso amigo o argumento irrespondível da garota: “Você prefere que isso aconteça aqui ou na rua?”

Pois bem, chegou o grande dia. O garotão que já havia sido apresentado à família do Abreu numa ocasião anterior, instalou-se na casa do sogrão de armas e bagagens numa sexta-feira, a pretexto de dormir lá para ele e a namorada não perderem o horário do passeio que fariam no sábado.

Depois de dormir mal a noite inteira, com algodão nos ouvidos para que nenhum som vindo do quarto ao lado ferisse seu instinto paterno superprotetor, o Abreu levantou cedo e foi pra cozinha fazer o café. Não achava justo que, depois de levantar cedo a semana inteira, a senhora Abreu ainda ficasse responsável pelo desjejum dos finais de semana. Ele já estava entretido com a vitamina e os ovos mexidos quando o pior aconteceu.

A primeira estocada no coração do nosso companheiro de copo foi dada no momento em que o candidato a genro entrou na cozinha, com aquela expressão de quem fareja comida pronta. E pior, com um sorrisão enorme, de uma orelha a outra. Estava na cara, literalmente, que ele teve uma noite maravilhosa.

Só aquele sorriso já seria capaz de deixar marcas psicológicas profundas no Abreu, papo de fazer análise e o cacete. Aquele sorriso falava por si só, aquele sorriso já dizia tudo. Infelizmente o desgraçado, o fiodaputa, o safardana, o meliante, o miserável do garotão achou que não. Ele realmente achou que tinha que dizer alguma coisa. Não sei se ele quis ser engraçado, quebrar o gelo, sei lá, mas ele acabou começando (e terminando) a conversa com essa pérola:

_ Pô, vai ser legal mesmo tomar uma vitamina caprichada. Sua filha me deixou acabadão essa noite.

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Pelas informações que tivemos, o rapaz ainda sente algumas dores, mas já voltou a mastigar os alimentos normalmente. E o Abreu deve comparecer à delegacia ainda essa semana.

Da Silva, no Ogro online.

2 comentários:

Daniel Marinho disse...

kkk .... modernidade aumenta o índice de violencia! rs

sandro alves disse...

muito bom este texto !!!!!!!!!adorei o desfecho foi ótimo !!!!!!!

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