2.2.10

Democracia à brasileira

Esse é um país original. Após a Independência, saímos de uma Monarquia Absolutista para uma Monarquia Constitucional por um ato absolutista: D. Pedro I fecha a Assembleia Constituinte, e como “Imperador e Defensor Perpétuo do Brasil” nos impõe a Constituição de 1824. O Imperador hereditário, que nomeava os membros do Conselho de Estado, o Presidente do Conselho de Ministro e os Governadores das Províncias. Eleição indireta para o Senado. O voto era aberto, e dele participava apenas 3% da população: os varões, brancos, proprietários e católicos romanos.

Com o golpe militar republicano (pois o Partido Republicano nunca passou de 5% dos eleitores), saiu a exigência de propriedade ou renda (Lei da Mandioca) e entrou a exigência de alfabetização, visando excluir os negros libertos. Resultado: na Primeira República caímos de 3% para 1% da população que tinha direito ao voto, o que incluía apenas as mulheres empresárias ou detentoras de diplomas de nível superior, que dizer, nenhuma. O voto continuava aberto e os Partidos Republicanos estaduais funcionavam como um partido único ganhando todas as eleições.

Vargas foi eleito indiretamente em 1934, e a nova Constituição cria o voto secreto, mas mantém a exigência de alfabetização em um país de analfabetos. Ditadura e Constituição imposta em 1937 com o fechamento de todos os partidos e suspensão de todas as eleições. Vem a “redemocratização” e a Constituição de 1946, dependendo de regulamentações de quem não queria regulamentar.

País ainda de maioria rural, de domínio dos “coronéis”, do voto comprado por um corte de chita, ou sob ameaças. Domínio das elites com povo manipulado (populismo). Com a urbanização e a industrialização, com o povo pressionando por reformas, se levanta o fantasma da "ameaça comunista", e tome 29 anos de Ditadura Militar, com eleições coreográficas e esvaziadas para os dois partidos consentidos, desde que apenas um (ARENA) vencesse sempre.

Puxaram o tapete das "diretas já", fizeram uma Constituinte de arremedo, no lugar de se regulamentar mais de 80 artigos da Constituição de 1988, ela foi desfigurada pelas PECs, especialmente com FHC, que aprofunda o desmonte da legislação trabalhista.

Periodicamente somos chamados a escolher entre aqueles que foram escolhidos para que nós escolhêssemos. A soberania nacional e a soberania popular foram esvaziadas, e a grande imprensa manipula a opinião pública. O Congresso Nacional é uma pirâmide invertida da pirâmide da sociedade brasileira: quanto maior for o segmento social da base menor o número de representantes; quando menor o grupo no topo, maior a bancada.

O poder econômico controla o poder político, o resto é marketing, retórica e coreografia.

Na Democracia à Brasileira bem cabem as palavras do saudoso Florestan Fernandes: “Essa é uma burguesia lúcida, consciente, que montou um projeto de contrarrevolução permanente para evitar qualquer réstia de poder do povo".

A crescente população protestante ou continua alienada “vendo a banda passar" ou já está por dentro dos esquemas, salvo as clássicas "honrosas (e queimadas) exceções".

2010 não está sinalizando nenhuma alteração nesse estado de coisas!

Robinson Cavalcanti, bispo anglicano.

2 comentários:

Daniel disse...

texto inteligente, parabens.

Timilique! disse...

Toda História deveria ser contada e recontada na voz de todos os personagens e observadores, não é mesmo?
Sempre me incomodou, na história brasileira recente, a omissão silenciosa e acovardada da igreja protestante, principalmente no auge da ditadura.Digo "me incomodou" porque, na década de 70, eu era levada aos cultos dominicais de uma enorme e tradicional congregação paulistana onde não eram infrequentes os "sumiços" de alguns membros mais articulados.
Nem uma palavra sobre o assunto era dita. Nós, crianças pequenas à época, tínhamos a impressão de que 'sumir do nada' era algo quase natural, uma espécie de "arrebatamento" adiantado.
...
Imagino o dia em que um livro didático pudesse apresentar esse texto do Robinson Cavalcanti.

Como não vivo de suspiros, a primeira atitude que tomo é mostrar o resumo do nosso "país original' aos meus filhos e recomendar que o levem na volta às aulas...um bom texto para se começar uma discussão.
Gostei muito da seleção do texto.

Abraços

Helena Beatriz Pacitti

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