Sou de um tempo em que a expressão “Cuba Libre” se referia a uma dose de rum com coca-cola, e se ouvia a “Guatanamera”. Cuba era uma ex-colônia espanhola, ex-colônia norte-americana governada por um ditador corrupto chamado Fulgencio Batista, um quintal dos Estados Unidos, funcionando como bordel de fim de semana para os endinheirados do Tio Sam, e com a sua população vivendo na miséria típica e as elites nos privilégios típicos da América Latina.
Veio a Revolução, e toda a minha geração vibrou. Vimos que a primeira visita de Fidel Castro foi aos Estados Unidos, falando no Clube de Imprensa em Nova Iorque, pedindo apoio para implantar uma social-democracia, reformista e nacionalista. Recebeu, como resposta, um coice, pois ali os interesses nacionais são os interesses das empresas nacionais, e uma transformação como a proposta por Castro seria um mau exemplo para o continente, que, pouco depois, viria sofrer, por décadas, o ciclo de ditaduras militares, com o apoio do norte.
Em dois anos Castro foi empurrado para os braços da União Soviética, houve a frustrada tentativa de invasão da Baía dos Porcos, a Cia tentou assassiná-lo várias vezes, decretou-se o embargo econômico, onde o mais prejudicado foi o povo. O regime universalizou a educação e a saúde, devolveu o orgulho nacional, mobilizou a população em ações cívicas, mas, por fatores externos e internos, adotou o modelo soviético, com severas restrições aos direitos civis e às liberdades públicas. Hoje, empobrecida e repressiva, incomoda pela altivez, e demonstra que o embargo foi apenas contraproducente, faltando estadistas de visão larga nos Estados Unidos. Por que não há embargo contra a China? Ela está longe, e é hoje um importante parceiro comercial.
Por um lado, em nossos dias, a democracia é tida como um valor universal, por outro lado, ela ainda é um artigo escasso, diante das muitas ditaduras republicanas (ideológicas ou não) e de umas tantas monarquias absolutas, "amigas" da (Des) Ordem Internacional. A maioria das democracias se encaixa no que os cientistas políticos chamam de “democracias governadas”, onde o povo apenas escolhe periodicamente quem vai mandar nele, e raras são as “democracias governantes”, onde há mecanismos que tornam o povo realmente um sujeito político.
Nesse contexto o Presidente Lula visita Cuba, quando clássicos princípios do Direito Internacional Público, como a autodeterminação dos povos e a não ingerência nos negócios internos de países soberanos, estão cada vez mais arranhados. Talvez em nome desses princípios (e do silêncio sobre o autoritarismo “amigo” por aí a fora), o dirigente brasileiro foi, digamos, diplomático.
Creio que nenhum brasileiro gostaria que um presidente estrangeiro em visita ao nosso país denunciasse a tortura contra presos comuns (pobres e pardos) que marcam o cotidiano dos nossos porões, ou apontasse para os grupos de extermínio, financiados se sabe por quem... Mas, creio que o presidente Lula silenciou também porque teria consequências muito maiores se ele também denunciasse as mazelas da “outra Cuba”: Guantánamo.
Não é apenas o absurdo que um pedaço de Cuba seja território norte-americano com suas bases, mas o que ali acontecesse hoje como negação de tudo aquilo que os Estados Unidos sempre pregaram e que o mundo civilizado pretende adotar: o único território sem Lei em todo globo, o único arbítrio absoluto da terra. Quem ali está, em geral sequestrado em outro país, tem a presunção de culpa, não está sujeito nem às Leis norte-americanas, nem às leis cubanas, nem às leis dos seus países de origem, nem às leis internacionais. Classificados pela figura juridicamente inexistente de "inimigos combates" são confessadamente torturados, nem tem acesso a advogados nem julgamento por um tribunal regular, ficarão presos por tempo indeterminado (e bote tempo nisso!), e serão devolvidos quando as autoridades militares dali quiserem para algum lugar do globo.
Junto da Cuba-Guantánamo a Cuba de Fidel é uma amável Suíça. Não estamos aqui defendendo um campeonato, para ver quem viola mais os direitos humanos, mas apenas denunciando as contradições do império e da imprensa-empresa e a hipocrisia de ambos, que muita maria-vai-com-as-outras acaba, papagaiadamente, indo a reboque.
Lula não falou dos males da primeira Cuba porque era forçado a silenciar sobre os males da segunda.
Robinson Cavalcanti, bispo anglicano.
Nós, como cristãos, defensores de princípios e não de interesses, denunciamos os males de ambas!
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5 comentários:
Como costuma dizer o professor Robero Romano, esse é um texto para ler com o nariz tapado...lixo ideológico do "Bispo" Cavalcanti....lamentável.
Embora ressalte de maneira maniqueísta as contradições de ambos os lados, Robinson passa por alto duas situações que implantaram estado de guerra entre as partes citadas - EUA e Cuba, e EUA e o movimento islâmico radical, representada por Al Qaeda.
Quanto a Cuba, o país iniciou estado de guerra com os EUA com a instalação de ogivas nucleares soviéticas apontadas para os EUA e jamais renunciou tal estado. Também, embora exista esse estado de guerra, os EUA são a maior fonte de divisas externas da Cuba atual. Inclusive, milhares viajam com freqüência entre os países, graças a um "jeitinho american".
Quanto a Guantánamo, bem, apesar da atual administração prometer fechar essa base até o início deste ano, não conseguiu realizar sua promessa. Ninguém quer esses prisioneiros. E muitos dos que já foram libertos voltaram ao terrorismo.
São detalhes da realidade que o autor ignorou ao escrever o artigo.
Adicionei o Pavablog a minha lista de favoristo.
Um grande abraço.
jc
Muito bom este artigo, pena os comentários detratantes daqueles não estão acostumados ao diálogo.
Em relação a questão de direitos humanos, acho que nenhum governo escapa. O Estado por si mesmo já é opressor.
As palavras têm muitas utilidades e uma delas é a revelação do caráter. Cristãos, ateus, bispos ou presidentes, têm o seu íntimo revelado por aquilo que falam ou escrevem. Ao escrever isso sei que sou e serei julgado com a mesma medida que costumo medir, mas isto não me impede de proclamar o que penso. Em 11/11/2009 a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado aprovou um voto de repúdio ao governo cubano pela prisão da escritora Yoani Sánchez, criadora do blog Generación Y. No dia 7 do mesmo mês, ela e dois outros blogueiros foram detidos por agentes de segurança durante uma passeata contra a violência.
E o que fez o Senador Suplicy? Absteve-se e defendeu que a votação do requerimento acontecesse somente após ouvir explicações da embaixada cubana no Brasil sobre o episódio. Diante da intimidação e da prisão arbitrária, ele pediu tempo para pensar. Isto não difere muito da simpatia de Robinson Cavalcanti diante dos Castro, dois homicidas contumazes responsáveis pela morte de 100 mil pessoas, 17 mil executadas (a conta está no Livro Negro do Comunismo) e outras 83 mil que morreram afogadas no mar ao tentar deixar a ilha, o que é proibido, [o que os torna 3.342 vezes mais homicidas que a nossa ditadura militar], o que o faz vir com aquela conversa mole de que, no passado, Fidel era apenas um cristão muito justo, convertido por necessidade ao socialismo. Isso é parte da mitologia esquerdopata para tentar atribuir aos EUA, que não teriam sabido compreendê-lo, a real responsabilidade por Cuba ter-se tornado o que se tornou. O que dizer de um país em que alguém é condenado a dois anos de prisão, por dizer frente às câmeras de televisão que em seu país se passa fome? Pois foi o que aconteceu com Juan Carlos González Marcos, conhecido como "Pánfilo", um cubano de 48 anos de idade como milhares de outros que não fazem parte da Nomenklatura e que passam todo tipo de privações, inclusive e, sobretudo, fome. Custava a Lula dizer uma palavrinha genérica em defesa da democracia, em vez de se comportar como mero espectador do espetáculo grotesco protagonizado por Raúl Castro, o homicida compulsivo, que culpou os EUA pela morte de Zapata. Isso não tem nada a ver com "autodeterminação dos povos e a não ingerência nos negócios internos de países soberanos”. Em relação aos outros pontos do artigo gostaria de contestar um por um, o que não convém, porém termino dizendo que "nós, como cristãos, defensores de princípios e não de interesses" devemos buscar e viver a verdade acima de qualquer convicção ideológica.
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