Eu não chamaria uma mulher de exótica.
É bonito, sugestivo, mas considero arriscado pronunciar para uma beldade que sua beleza é exótica. Dependerá do alzheimer ou de muita intimidade para ser esquecido.
Ainda que não seja ofensivo, ela vai sentir que é mais estranha do que bonita. Destacaremos uma anormalidade enquanto desejávamos anunciar sua singularidade. Não cai bem mesmo no baile a fantasia.
Paira sobre a frase uma nuvem negra: ele está me chamando assim para não me ofender? Beleza exótica tem um quê de educação. Prefiro mentir a usar.
O elogio que gera dúvida já é ofensa. Se ela não entendeu, não ouse explicar. Cantada não admite explicação.
Falta apenas completar que ela é um animal em extinção e tem que se reproduzir contigo para salvar a espécie.
Não há como festejar o enigma desse jeito, talvez encontre o estigma e lamente a casa vazia.
Cautela no momento de abrir a boca, o golpe deve ser empregado uma vez em toda vida, quando não há saída, quando não tem mais nada a falar, na total imobilidade, como o pulo de garça do Karatê Kid.
É uma expressão ambígua. Ao mesmo tempo em que se mostra encantado denuncia uma eventual perplexidade, um susto, tipo nunca vi nada igual. Percebe a sutileza?
O exotismo não ajuda na sedução. Afora a pressão que cria no relacionamento.
Ela não vai mais relaxar. A conversa será séria, quase um noivado, com a presença dos pais aborígenes e canibais.
Crescerá o medo de decepcioná-lo. Ela assumirá a responsabilidade descomunal de surpreendê-lo. Não ficará mais livre para ser comum. Proibida de cumprimentar com “oi” ou “tudo bem?”, forçada a comprar charutos na Finlândia e desdenhar dos doces de Copenhague. Terá que ser exótica para qualquer coisa, condenada a honrar a fama.
Você abriu a porta ao surrealismo, ao insólito, ao absurdo.
Convidará a garota para sair e ela dirá que não pode, vai pular de pára-quedas de noite, após cumprir seu serviço de espionagem dos rótulos de cerveja numa boate gay. Oferecerá uma carona e ela dirá que não pode, há um tanque da antiga União Soviética em seu quintal, que impede visitas civis. Chamará para um café, e ela dirá que não pode, que somente toma biotônico fontoura.
Depois do primeiro contato, a mulher exótica desaparece. O que não é exótico perto da grosseria de tentar reduzir seus encantos a uma jaula de zoológico.
Fabrício Carpinejar
arte: Georg Baselitz
6.3.10
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Um comentário:
Nussa. Falar "beleza diferente" ou "beleza incomum" é a mesma coisa? Hm, preciso rezar. :)
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