16.6.07

Dois caminhos

Mário Vargas Llosa quase virou personagem de um de seus próprios romances ao disputar as eleições presidenciais do Peru, nos anos 90. Perdeu por pouco, continuou aclamado como escritor, e virou uma das grandes vozes críticas na América Latina.

Don Mario, como ele é conhecido, continua dono de uma enorme produção literária – e é considerado um dos maiores romancistas vivos. Nesta entrevista exclusiva, ele fala sobre os perigos do populismo na América do Sul e diz que quer continuar a escrever.

Em 1990, dois candidatos chegaram perto da presidência do vizinho Peru. O eleito foi Alberto Fujimori – hoje cumprindo prisão domiciliar, acusado de inúmeros crimes; o candidato derrotado era um prestigiado escritor de romances, peças teatrais e ensaios. Mario Vargas Llosa.fala, nesta entrevista especial, dos caminhos da América Latina, da própria obra, e daquilo que pode ser o nosso futuro.

Na Lima dos anos 40, o pai do menino Mario internou o filho em um colégio militar – para que se tornasse mais viril e esquecesse a paixão por poesia e literatura. Lá, o jovem branco de classe média conviveu com índios, mestiços, mulatos, negros – pobres. A verdadeira América Latina.

Para Llosa, essa convivência lhe abriu os olhos. “Abriu os olhos para o país em que eu nasci, e que praticamente desconhecia. Abriu os olhos para a violência das relações humanas, e me fez ver a complexidade que é a América Latina: as diferenças étnicas, os conflitos, os preconceitos, os ressentimentos. Foi uma experiência traumática, mas me ajudou a entender o mundo em que eu havia nascido", conta Vargas Llosa.

Muito mais tarde, esse menino que foi parar na escola militar se tornou candidato à presidência da República. Como explicar? “Eu havia organizado um protesto contra a nacionalização dos bancos, das companhias de seguro e das instituições financeiras proposta pelo presidente Alan García – sim, o mesmo de agora, só que hoje ele tem uma política bem diferente, felizmente, para o Peru”, diz Llosa. “Conseguimos deter a nacionalização. Daí surgiu a idéia de tornar aquele movimento mais permanente: minha candidatura. Foi uma experiência bastante difícil, mas também enriquecedora, para entender o que é a política, e sobretudo para entender que eu não era político”.

Para Vargas Llosa, a América Latina está dividida entre dois caminhos: o abismo obscurantista e a recuperação democrática. “Eu vejo com muita preocupação o que ocorre na Venezuela. Não direi Cuba porque Cuba é como a pré-história, que já não exerce praticamente influência. Mas a Venezuela é diferente, porque Hugo Chavez é um demagogo com dinheiro, com petrodólares, que investe para promover sua idéias de revolução. Ele está subornando governos latino-americanos com promessas e às vezes com realizações. Ele representa um perigo que poderia destruir a democracia que temos, e poderia conduzir a um atraso a uma época que foi tão desastrosa para o continente”, avalia o escritor.

Alguns o chamam de conservador; outros, simplesmente, de reacionário. Ele discorda. ”Eu sou um liberal”, define-se. Vargas Llosa. “aAextrema esquerda converteu essa palavra em um palavrão, xingamento, mas ela se origina da palavra ‘liberdade’ – a palavra mais bonita do idioma, que trouxe as grandes conquistas: a tolerância, os direitos humanos, a divisão de poderes, o pluralismo político. Todas as grandes conquistas da civilização têm sua origem no progresso da liberdade. “O importante do pensamento liberal é que não se trata de um pensamento dogmático, não é fanático e aceita a possibilidade de equivocar-se, de estar errado – e portanto está permanentemente se corrigindo e auto-criticando”, acredita.

Mas apesar de crítico, Vargas Llosa é bastante otimista. “Vejo o continente latino-americano com bastante otimismo. Há trinta anos, estávamos vendo as ditaduras militares na América Latina ou sociedades divididas por guerras revolucionárias e contra-revolucionárias. Hoje não é mais assim; temos apenas duas ditaduras – a de Fidel Castro, que é uma ditadura pré-histórica, e a ditadura em construção de Chavez. Mas no resto do continente, temos governos mais ou menos democráticos, fruto de eleições diretas”, analisa.

Ele mantém o otimisto em relação ao próprio futuro. “Meu futuro é ser escritor. Essa é minha vocação, é o que sou. Creio que o mais importante que tenho são os livros que escrevi e os que espero escrever, e espero ter tempo para escrever muito mais”.

Um comentário:

Anônimo disse...

Não concordo com ele. Ponto.

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