Don Mario, como ele é conhecido, continua dono de uma enorme produção literária – e é considerado um dos maiores romancistas vivos. Nesta entrevista exclusiva, ele fala sobre os perigos do populismo na América do Sul e diz que quer continuar a escrever.
Em 1990, dois candidatos chegaram perto da presidência do vizinho Peru. O eleito foi Alberto Fujimori – hoje cumprindo prisão domiciliar, acusado de inúmeros crimes; o candidato derrotado era um prestigiado escritor de romances, peças teatrais e ensaios. Mario Vargas Llosa.fala, nesta entrevista especial, dos caminhos da América Latina, da própria obra, e daquilo que pode ser o nosso futuro.
Na Lima dos anos 40, o pai do menino Mario internou o filho em um colégio militar – para que se tornasse mais viril e esquecesse a paixão por poesia e literatura. Lá, o jovem branco de classe média conviveu com índios, mestiços, mulatos, negros – pobres. A verdadeira América Latina.
Para Llosa, essa convivência lhe abriu os olhos. “Abriu os olhos para o país em que eu nasci, e que praticamente desconhecia. Abriu os olhos para a violência das relações humanas, e me fez ver a complexidade que é a América Latina: as diferenças étnicas, os conflitos, os preconceitos, os ressentimentos. Foi uma experiência traumática, mas me ajudou a entender o mundo em que eu havia nascido", conta Vargas Llosa.
Muito mais tarde, esse menino que foi parar na escola militar se tornou candidato à presidência da República. Como explicar? “Eu havia organizado um protesto contra a nacionalização dos bancos, das companhias de seguro e das instituições financeiras proposta pelo presidente Alan García – sim, o mesmo de agora, só que hoje ele tem uma política bem diferente, felizmente, para o Peru”, diz Llosa. “Conseguimos deter a nacionalização. Daí surgiu a idéia de tornar aquele movimento mais permanente: minha candidatura. Foi uma experiência bastante difícil, mas também enriquecedora, para entender o que é a política, e sobretudo para entender que eu não era político”.
Para Vargas Llosa, a América Latina está dividida entre dois caminhos: o abismo obscurantista e a recuperação democrática. “Eu vejo com muita preocupação o que ocorre na Venezuela. Não direi Cuba porque Cuba é como a pré-história, que já não exerce praticamente influência. Mas a Venezuela é diferente, porque Hugo Chavez é um demagogo com dinheiro, com petrodólares, que investe para promover sua idéias de revolução. Ele está subornando governos latino-americanos com promessas e às vezes com realizações. Ele representa um perigo que poderia destruir a democracia que temos, e poderia conduzir a um atraso a uma época que foi tão desastrosa para o continente”, avalia o escritor.
Alguns o chamam de conservador; outros, simplesmente, de reacionário. Ele discorda. ”Eu sou um liberal”, define-se. Vargas Llosa. “aAextrema esquerda converteu essa palavra em um palavrão, xingamento, mas ela se origina da palavra ‘liberdade’ – a palavra mais bonita do idioma, que trouxe as grandes conquistas: a tolerância, os direitos humanos, a divisão de poderes, o pluralismo político. Todas as grandes conquistas da civilização têm sua origem no progresso da liberdade. “O importante do pensamento liberal é que não se trata de um pensamento dogmático, não é fanático e aceita a possibilidade de equivocar-se, de estar errado – e portanto está permanentemente se corrigindo e auto-criticando”, acredita.
Mas apesar de crítico, Vargas Llosa é bastante otimista. “Vejo o continente latino-americano com bastante otimismo. Há trinta anos, estávamos vendo as ditaduras militares na América Latina ou sociedades divididas por guerras revolucionárias e contra-revolucionárias. Hoje não é mais assim; temos apenas duas ditaduras – a de Fidel Castro, que é uma ditadura pré-histórica, e a ditadura em construção de Chavez. Mas no resto do continente, temos governos mais ou menos democráticos, fruto de eleições diretas”, analisa.
Ele mantém o otimisto em relação ao próprio futuro. “Meu futuro é ser escritor. Essa é minha vocação, é o que sou. Creio que o mais importante que tenho são os livros que escrevi e os que espero escrever, e espero ter tempo para escrever muito mais”.
fonte: Jornal da Globo
Um comentário:
Não concordo com ele. Ponto.
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