AMIGO TORCEDOR, amigo secador, imagine que os gols de mão da semana, de Adriano (São Paulo) e de Diogo Rincón (Corinthians), tenham sido marcados num tempo em que contássemos com recursos tecnológicos do tira-teima para auxiliar os juízes, certo?
Viaje, amigo, abstraia o chefe cricri, esqueça o latifúndio dorsal da bela secretária, esqueça as dívidas, o consórcio, ignore a ruindade do mundo, as manchetes sangrentas, esqueça a suspeita de que a amada, a essa hora, sim, agora mesmo, enquanto você redige o memorando, enquanto você enriquece o seu dono, pratica o maior esporte olímpico dos trópicos: o salto da cerca, o arame farpado e moral do casamento.
Esqueça que o ser humano é capaz de cometer qualquer crime e toda a sorte de atos falhos, somos um ralador de cocos de erros, uma comédia, mas esqueça Caim e Abel e todas as nossas cegueiras, pense que vive em um mundo perfeito e que é capaz de enxergar tudo o que sempre ocorre à sua frente, imagine-se a própria virtude metida em belas calças de alfaiate, um passo adiante, amigo, seja mais objetivo, elimine toda e qualquer injustiça do universo, pois você é moderno e detesta românticos.
Sim, amigo, estamos num futuro próximo, 2013, por exemplo, minha milhar preferida no jogo do bicho, dezena da borboleta, óbvio, espero que, até lá, não acabem com a minha alegria zoológica. Eis que em 2013, a tropa de elite da objetividade triunfa, foram-se os anéis, mas continua a dúvida: mão na bola ou bola na mão?
Responda rápido, pois você é do time dos objetivos. Como Fifa, CBF, Desafio ao Galo, Peladão de Manaus e os campinhos de Bento Ribeiro e Vila da Penha, além de Quintino, na zona norte carioca, já adotaram o sistema "Big Brother". Tudo certo como 2 e 2 são 5. Câmera 2, please!, a que fiscaliza a grande área.
E agora, dona Justa, invalida o gol de mão do Adriano ou marca pênalti para o São Paulo, já que ficou claríssimo o puxão na camisa do moço?
Quem decide? Chama a câmera 3, a do reforço, ainda há dúvidas?
Consulta o comentarista de câmeras e de arbitragem da emissora oficial que é dona dos jogos? Chama o fantasma do Mário Viana e o seu grito que ecoava no Maraca e tirava o juízo de Deus?
Ah, faz favor, chama o quero-quero que sobrevoava a marca do pênalti naquela hora e, sinto muito, carimba Luciano!
Chama o garçom, Moreno, que estou a caminho da Bracarense, e não me tira a bela discussão do boteco, melhor pôr a culpa, sempre, no homem de preto -se bem que esses juízes andam meio rosa-choque!- do que no homem da câmera, afinal de contas, olho por olho, que pelo menos não seja olho de vidro.
E, por favor, maestro, "Für Elise", para Elisa, toca outra vez, Ludwig, a música do homem do gás, agora em homenagem à bela bandeirinha homônima que pisou nos astros distraída, como todos pisamos na bola, quase sempre, dentro e fora das quatro linhas ou paredes. Dorme em paz, galega, que o videoteipe, além de burro, agora é misógino ou gay!!!
Xico Sá, na Folha de S.Paulo.
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18.4.08
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