Querendo explicar a atitude que ele esperava de seus ouvintes, Jesus abraçou uma criança, colocou-a no meio deles e disse que quem não recebesse o Reino de Deus como uma criança não entraria nele. Para entrar no Reino é preciso ser como uma criança, porque uma criança é pura, simples, crédula, confiante. Ao mesmo tempo em que traz a criança para o centro das atenções, não relegando-a a uma criatura de segunda categoria, como faziam os seus contemporâneos, Jesus quer nos fazer entender que precisamos aprender com elas, caso queiramos, um dia, ser participantes de seu Reino.
A pureza de uma criança a impede de ver maldade em tudo, de perceber segundas intenções. Também a impede de falsear a verdade e usar máscaras, como os adultos fazem, elas são muito sinceras. São simples. Mesmo aquelas crianças desprovidas de bens e brinquedos caros, riem com facilidade brincando com uma lata ou uma caixa, que são seus brinquedos imaginários. São crédulas, acreditam no que os adultos lhes contam e neles confiam. Precisam se sentir seguras, então confiam nas figuras que podem lhe dar segurança: nós, os adultos.
É exatamente por serem crédulas e confiantes é que são tão vulneráveis a abusos. A família, a sociedade e o poder público têm o dever de preservar suas crianças, zelar pelo bem delas e colocá-las a salvo de qualquer forma de opressão ou violência. Se não conseguimos fazer isso, falhamos.
Muitas crianças estão tendo sua infância roubada pela violência doméstica, ainda muito tolerada em nossa sociedade, mas que, com o argumento de ser uma disciplina, pode ser uma válvula de escape para os adultos descontarem nas crianças suas frustrações. Bater num adulto é crime, bater numa criança não. Isso é um contra-senso. É um abuso em todos os aspectos, a começar pela desproporção física.
Outras têm sua infância roubada pelo trabalho numa idade inadequada. Várias são as razões e explicações sociológicas para o trabalho infantil, mas o fato é que isso rouba das crianças um tempo precioso, que não volta, no qual deveriam estar estudando, brincando e se desenvolvendo para, depois, maduros e preparados, enfrentarem o mundo do trabalho.
A pior forma de roubar a infância, entretanto, é o abuso e a exploração sexual. Quando isso acontece, está-se roubando a pureza, a candura e o direito de uma sexualidade saudável, que, para ser saudável, deve acontecer na época certa. As marcas em uma criança abusada são indeléveis. Ainda mais quando pais, familiares e pessoas próximas é que são os responsáveis ou facilitadores do abuso. Em quem essa criança vai confiar? Como ficará a cabeça dessa criança? Como estarão seus afetos? Onde estarão seus referenciais?
É um crime abjeto. Que sociedade queremos ser se não cuidamos de nossas crianças?
Precisamos aprender o verdadeiro significado do princípio constitucional da Proteção Integral à criança. Precisamos também aprender com Jesus que criança não deve ficar marginalizada ou ser considerada um ser de menor importância, mas deve ser trazida para o centro das discussões. Seremos uma sociedade melhor se assim fizermos.
Márcio Rosa da Silva, em texto publicado na Folha de Boa Vista após a polícia de Roraima desbaratar uma quadrilha de pedófilos.
8.6.08
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