Gabam-se muitos entusiastas por aí de que temos alcançado um alto nível enquanto civilização. No melhor estilo século XIX, feitos tecnológicos e sociais são apontados como um indicador de que temos melhorado enquanto humanidade. Hoje é possível transpor qualquer distância dentro do planeta em um período de algumas dezenas de horas. Há progresso na medicina, educação e infra-estrutura como nunca na história. A tecnologia simplifica e automatiza tarefas cada vez mais variadas.
É verdade. Tudo isto está disponível. Mas a vitrine do progresso não vem com etiqueta de preço. Quem quer um carro e não tem alguém que banque ou sorte no bingo precisa se amarrar por cinco, seis, sete anos em uma dívida que o fará pagar um carro a mais em juros. Viajar de avião, para quem não é rico ou agraciado com promoções surpresa, custa seis meses (ou mais) de parcelas no orçamento apertado. A medicina alcançou avanços assombrosos, mas ter acesso a ela significa gastar muito dinheiro. A educação atinge níveis não imaginados com a Internet, a mais democrática das redes. Mas ter acesso a ela não é lá tão democrático assim.
Morar em um lugar com boa infra-estrutura significa para a maioria depositar a maior parte da renda mensal na conta do Senhor Barriga, ou alvejar os cabelos em um financiamento eterno, proibitivo para a maior parte de pessoas. A Constituição e o Código Penal vedam penas de caráter perpétuo, mas há uma exceção: a condenação proferida no contrato de compra da casa própria. O crime é querer um lugar pra viver.
Existe a possibilidade de se desfrutar as coisinhas fantásticas que a tv digital, o home theater, a cafeteira, a geladeira com duzentas mil funções e os poderosos novos celulares podem oferecer, mas não sem usar o cartão de crédito e ficar de uma Copa a uma Olimpíada pagando a conta. Para trazer todas as facilidades do mundo moderno pra casa basta vender-se escravo da fatura.
Os avanços prometem trazer facilidade e conforto. Mas a poucos que já tinham facilidade e conforto suficiente antes. Para a maioria, usufruir deles significa tomar um pesado fardo sobre si para que uns poucos deleitem-se. E não apenas no que é supérfluo. Comer é caro, deslocar-se é caro, habitar é caro. Ainda vou entender o que a Constituição quis dizer com “a propriedade atenderá a sua função social” (Art. 5º, XXIII), talvez porque adquirir uma propriedade sem ter posses anteriores é tão difícil quanto explicar onde está essa função social.
Se a humanidade está avançando, gritem, pois esqueceram um monte de gente aqui atrás.
Teo Victor, no blog Um bicho de Rondônia.
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21.9.08
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