2.8.09

Igrejas Evangelásticas

O Thiago Bomfim escreveu uma postagem essa semana chamada Photoshop na Celulite da Igreja, comentando sobre algo que eu tenho pensado com uma certa frequência nos últimos meses: a tentativa de fazer uma plástica na imagem da igreja para deixá-la bonitinha e atrativa. Na verdade, meus pensamentos têm sido mais específicos, direcionados para a criação dessa imagem na divulgação de igrejas e ministérios por meio da internet. Antes que qualquer pessoa pense que eu seja contra o uso da internet para divulgação da igreja/ministério, deixe-me afirmar que não sou. Muito pelo contrário, na Era Google, não há como fugir da presença na internet. Todavia, o que me preocupa (e um dos motivos que fez com que tirássemos nosso site do ar há meses para uma reformulação total) é como nós utilizamos desta ferramenta poderosa de comunicação.

No meio missionário, há anos que ouço o termo “números evangelásticos” para se referir aos exageros cometidos ao relatar o resultado de uma campanha evangelística. Tinha 100 pessoas, mas o relatório diz que tinha 250… 500 ou 1000! Convivendo com pastores, cansei de ouvir relatórios mentirosos de suas igrejas, exagerando o número de membros, freqüência de cultos, batismos, etc. Acabei de acessar o site de uma igreja, e um vídeo anunciando um evento tinha um narrador com uma voz “poderosa”, cheia de eco e efeitos, como se o recado viesse do além. Até mesmo um artigo sobre o relatório de estatísticas de acesso na internet denunciava como alguns marqueteiros mentem sobre o números de acesso/visitantes, divulgando, na verdade, o número de hits em seus sites (geralmente 10 vezes maior do que o número real de visitantes).

Recentemente estava ouvindo uma entrevista com Eugene Peterson e percebi que esse parece ser um fenômeno global. Ele falava sobre seu primeiro pastorado e sobre como os pastores mentiam em seus relatórios nas convenções. Há trinta anos George Verwer falava sobre a mentira do exagero, essa tendência de aumentar os números/estatísticas (ou simplesmente dizer que fez jejum, leu a Bíblia e orou, quando não fez nada disso), como um sinal de pseudodiscipulado. O que me parece é que a pressão para ser bem sucedido, relevante e atrativo pode se tornar uma armadilha, levando a tais exageros e mentiras. Ou fazer o que Bomfim apontou em sua postagem: usar um Photoshop para dar uma imagem cool na igreja/ministério, eliminando suas celulites.

Lendo Seth Godin (Tribes e The Dip), me deparei com o título de outro livro seu que foi um sinal de alerta para mim: All Marketers Are Liars (todos os marqueteiros são mentirosos). Não li esse livro e não sei o que Godin diz exatamente sobre os marqueteiros serem (ou não) mentirosos, mas de qualquer maneira fiquei pensando se, na ânsia de embelezar a igreja, transmitir algo e atrair pessoas para “nossa” causa, não escorregamos em alguma mentira (ou “mentirinha”) e acabamos criando igrejas e ministérios “evangelásticos”.

Em So Beautiful, Leonard Sweet fala sobre Cristianismo APC, referindo-se a um medicamento muito usado pelos militares nos EUA na década de 1950 que prometia o alívio para tudo. Tinha um problema porém, o APC causava dependência. E o pior, mais tarde descobriu-se que o uso prolongado desse medicamento levava à morte. Ou seja, o APC de fato funcionava, mas era uma armadilha mortal a longo prazo.

Creio que o marketing mal utilizado (mentiroso) pode ser um reflexo desse Cristianismo APC. Mente-se para atrair, crescer, ser bem sucedido. Mente-se porque se propaga algo que não é verdadeiro, algo ilusório, superficial. A imagem é bonita, mas não há substância por trás da mesma. Atrai pessoas, vira notícia, causa toda a impressão de ser um sucesso. E como o sucesso vicia, então é preciso continuar mentindo para mantê-lo a qualquer custo. Com o passar do tempo, os resultados geralmente são catastróficos.

Nas palavras de Leonard Sweet: “Algumas coisas podem fazer sua igreja crescer rápido e grandemente em meses e anos, entretanto, com o passar de décadas podem ter efeitos debilitantes no corpo de Cristo, e até mesmo matar você se não matar seu espírito.”

Que Deus nos ajude a nos livrar de toda e qualquer mentira sobre nós mesmos e nossas igrejas, a buscar a honestidade e realidade no modo como nos apresentamos aos outros (seja na internet ou de qualquer outro modo) e, acima de tudo, encontrar a liberdade para ser quem Deus nos chamou para ser, livres da necessidade de ficar nos comparando com esse ou aquele ministério ou igreja.

Sandro Baggio
dica da Maria Bernardete Maia Dantas

Um comentário:

Chicco Salerno disse...

Se todos os relatórios feitos por missionários radicados no Brasil e/ou igrejas, nos quais aparece o número de pessoas convertidas em um dado período, tivessem os seus números de convertidos somados, certamente a população brasileira inteira já estaria salva, próspera e nosso país seria o Éden na Terra em plena Era de Aquarius.

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