10.10.09

Descobrir

Não te encontro, não te alcanço…
Só – no tempo equilibrada,
desprendo-me do balanço
que além do tempo me leva.
Só – na treva,
fico: recebida e dada.
Porque a vida, a vida, a vida,
a vida só é possível
reinventada.

Cecilia Meireles

Ainda me encanta a capacidade do ser humano de descobrir, seja descobrir o mundo, descobrir a si mesmo e descobrir o outro.

Na infância, dizem, o conhecimento se dá por descobertas que a própria criança faz .Educar parece ser agora visto como “provocar a atividade”.

Quem convive com uma criança de 2 anos repara como o bebê desenvolve a percepção de si mesmo e dos objetos a sua volta. É capaz de passar longos períodos descobrindo as próprias mãos, mexendo os dedinhos e se encantando com seus próprios movimentos, por exemplo. Será também preciso caminhar de mãos dadas com esta criança, tempos depois, para descobrir como é demorado conseguir chegar simplesmente ao final da quadra, porque a caminhada será fatalmente interrompida um sem número de vezes por um cachorro, uma pequena planta ou uma formiga carregando uma folha maior que ela mesma.

Mas o que hoje me intriga e me encanta é “descobrir pessoas”, mormente as que nunca cheguei a conhecer pessoalmente. Como isso se dá? Quando leio uma biografia, quando admiro uma obra ou um legado, quando conheço alguém pelo outro. Porque uma pessoa nunca é só ela mesma, mas o somatório de aquelas que a acompanharam ao longo da vida.

Outro dia “descobri” Mimi, que foi ao mesmo tempo amiga, filha, mãe, esposa e alguém que amou profundamente a vida. Tinha a marca da alegria de viver.Tenho ouvido algumas histórias sobre ela, seu jeito carinhoso com os amigos, suas frases, suas promessas, seus pedidos a quem amava. Fez suas escolhas, enfrentou algumas incompreensões temporárias, estudou, mudou-se, conquistou seu grande amor e deixou um legado permanente de companheirismo.

Mimi me fez entender melhor o significado de companheiro (do latim companionem: com – “com” e panis – “pão”), etimologicamente, aquele com quem se divide o pão.

Quem muito amou Mimi sabe que foi necessário dividir o pão com ela, conviver longamente para captar a beleza da sua pessoa. Ali não pude estar.Mas quem esteve me partilha, e assim a admiro imensamente. Admiro-a pelo que dela ainda brilha na gente, o cheiro da sua doçura, a força de sua alegria. E isso me encoraja hoje, tempos e lugares depois, quando, nas minhas descobertas de vida, percebo que ainda erro, ainda me precipito, ainda não acertei meus alvos, ainda perservero.

Mas é aí que surgem novas descobertas: é preciso descobrir o perdão: perdoar e ser perdoado. Descobrir a leveza. Descobrir que depois da tristeza vem a alegria. Que mesmo após doloroso luto, nasce vida nova. Descobrir que a vida , segundo Cecilia, só é possível reinventada.

Helena Beatriz Pacitti, no blog Timilique!

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