Budista light
O "ASSUNTO Deus" é complicado. Em jantares inteligentes, é mais fácil você confessar que faz sexo com dobermans, prova de que seu gosto ultrapassou formas sexuais conservadoras. Mas, se falar sobre Deus, há risco grave de que não te convidem mais. E aí nunca mais aquela cozinha vietnamita. Melhor se dizer um budista light.
Mas a mania que muito religioso tem de achar que tudo na vida se deve a Deus (ou similares) é um saco! Isso fala mais de sua preguiça e medo do que de Deus.
Entendo o bode dos ateus com essa gente. Para mim, essa conversa é semelhante ao papo de que você tem câncer porque não resolveu adequadamente seus conteúdos emocionais. Ora bolas, isso quer dizer que, se todo mundo um dia for feliz, ninguém vai ter câncer? Ou que, pior, além de ter câncer, você é um babaca responsável pelo câncer porque não fez terapia? Conheço gente que se diz ateia (e com isso se acha mais inteligente, como de costume) e acredita nessa baboseira de que o amor cura câncer.
Mas, desculpe-me, ateísmo é coisa banal. Quando eu tinha oito anos era ateu. O ateísmo é óbvio (por isso comecei a desconfiar dele), diante do lamentável estado da vida: somos uma raça abandonada (Horkheimer). Ateísmo não choca mais ninguém (pelo menos quem já leu uns três livros sérios na vida), porque ateus já são vendidos às dúzias em liquidações. E mais: ser ou não ateu não diz nada acerca de como a pessoa se comporta com os outros (ao contrário do que muitos ateus e não ateus pensam). Existem canalhas de ambos os lados do muro.
Deus, como se diz em filosofia, "é uma variável sem controle epistemológico", isto é, não se testa Deus em um laboratório.
Mas, antes, uma pequena heresia.
Mais chocante hoje é alguém confessar que não crê no aquecimento global, pelo menos na versão que aconteceu nesse espetacular concílio bizantino em Copenhague, reunindo toda a gente legal do mundo.
Confesso minha fraqueza: sou um herege, não acredito que meu pequeno carro aqueça o planeta, mas já estou pagando mais imposto por isso e tenho certeza de que outros virão. Acho essa história uma mistura de ego inflado (disputamos com o Sol para ver quem aquece mais?) e tédio (que tal salvar o planeta? A vida está tão chata na Dinamarca!). Meu cachorro anda triste? Deve ser o aquecimento global.
Sei que dizem que é fato científico, mas, para mim, que sou um medieval, só acredito na ciência quando vem no formato de resultados de exames do Fleury ou do Delboni, e não quando tem a ONU no meio e gente ganhando milhares de euros salvando o planeta.
Para mim, Copenhague foi aquele tipo de concílio onde se discutia se a roupa de Jesus era dele ou não. Temperamentos autoritários gozaram de tesão em Copenhague.
E o ateísmo? A constatação de que o mundo é péssimo e, por isso, Deus não deve existir é razoável. A primeira vez que isso me ocorreu foi quando descobri que existiam colegas mais felizes do que eu na escola, e aí eu julguei o mundo injusto. Se Deus, como todo mundo me dizia, era bom, por que eu não era o cara mais forte do mundo? Decidi que Deus não existia. Ou não era bom. O ateísmo é uma conclusão óbvia, não há nenhuma grande inteligência nisso. Qualquer golfinho consegue ser ateu.
Anos mais tarde, fosse eu uma dessas pessoas legais que creem no marketing do bem, concluiria que o mais justo seria que todos fossem igualmente felizes, e aí Deus teria sido democrático. Graças a Deus nunca passei pelo ridículo de pensar assim. Quanto a Deus ser mau, concluí que melhor seria mesmo considerar o universo indiferente e cego e mecanicamente cruel. Naquele dia, tornei-me um trágico (antes de ler Nietzsche ou Darwin).
Poucos ateus não são descendentes de uma criança infeliz e revoltada (e, veja, 110% das crianças, esses pequenos lindos monstros malvados, são infelizes porque sempre existem crianças mais felizes do que você). A prova disso é que ateus gostam de falar mal da igreja (nunca superaram aquela freira azeda), de Deus (esse malvado que não me fez mais forte), ou do pai judeu (que me obrigou a só namorar judias).Ou acham que, se formos todos ateus, o mundo será melhor. Se você é assim e tem orgulho de ser ateu, você é um rancoroso.
Quando se deixa de acreditar em Deus, passa-se a acreditar em qualquer besteira (Chesterton): na Natureza, na História, na Ciência, na Dinamarca, em Si Mesmo. Essa última crença, eu acho, é a pior de todas. Coisa de gente cafona.
Luiz Felipe Pondé
15.12.09
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8 comentários:
Boa analogia entre os extremos...
"Deus já deve estar de saco cheio, hehehehee"!
Um grande abraço.
_______
Leia também: RIO ENTERTAINMENT
http://jafogandooganso.wordpress.com
VARIEDADE CANINA
Depois de ler o texto postado hoje fui procurar outros textos do Luis Pondé (curto muito a forma como ele escreve). Dando uma lida nos textos do site Verdes Trigos vi um que fala sobre educação sexual, em dada parte do texto ele diz o seguinte: "Claro que hoje é mais normal num jantar inteligente você contar sua vida sexual com seu pastor alemão do que confessar em lágrimas que acredita em Deus"...
Na hora pensei que estivesse lendo o mesmo texto, mas vi que não era qundo fui conferir a raça do cachorro em questão. (rsrsrsrsrs)
Humor à parte, o cara muito bem e merece ser lido por todo mundo.
Vida longa ao Pavablog#
Vai o link do texto do Pondé que acabei de comentar.
http://www.verdestrigos.org/sitenovo/site/cronica_ver.asp?id=1673
Se a Metereologia não consegue nem prever o dia de amanhã para São Paulo, o que dirá para o Mundo daqui a 100 anos...
Pôxa vida, não diz que qualquer golfinho poderia ser ateu, pois golfinhos possuem mais neurônios do que os seres humanos e são extremamentes inteligentes. Qualquer dia desses vão descobrir um golfinho filosofando...rsss
abraços
esse pondê é um sofista de marca maior...
Mais um texto sensacional do Luis Pondé!
muito bom o texto, divertido e tal, mas acho que até essa distinção crente / ateu já é bem superada. Esse assunto é velho como a moda da novela "Rei do Gado".
Abraço!
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