25.8.08

Sapos cozidos

Há uma historinha antiga que conta que um sapo pode ser cozido vivo, desde que quem o deseja cozer o ponha dentro de uma panela com água fria e vá aquecendo-a muito gradativamente - contrariamente ao que aconteceria, se o sapo fosse posto em contato com água muito quente – ou fervendo: ele pularia fora (ou tentaria fazer isso).

Já havia decidido recorrer à metáfora do sapo, para este meu artigo (que – acredite – é sobre o famigerado horário "gratuito" do TSE, que voltou à cena, esta semana), quando resolvi dar uma checada na Wikipedia. Lá descobri que essa coisa de cozinhar ou ferver sapos tem muito a ver com a cultura anglo-saxônica e pouquíssimo com a nossa... Dá até pra entender. Para compartilhar com V. a minha nova erudição, ai vai: atribui-se a origem da história (que não seria verdadeira, de acordo com a moderna sapologia) aos relatos do fisiólogo G. Stanley Hall sobre experimentos com os citados batráquios; um deles em 1882, na Universidade Johns Hopkins, especificando que o cozimento ocorreu "em 2 horas e meia, tendo a temperatura sido aumentada à base de 0,002º por segundo".

A abençoada Wikipedia informa, também, que a história é uma ilustração moderna do paradoxo de Sorites – popular entre os filósofos gregos antigos -, sobre quando é que uma pilha de grãos de areia deixa de ser uma pilha... Mas este é assunto para outro artigo.

A questão que quero ilustrar é que os governos deste país – desde que fomos colônia – aprenderam a praticar muito bem, com seus cidadãos, a técnica de cozinhá-los, como sapos, até que percam a paciência, ou a vida.

A volta deste horário "gratuito" do TSE ilustra bem isso. Todos já nos acostumamos. Já ninguém reclama do autoritarismo e da arbitrariedade que criaram esta praga na nossa sociedade. Nem mesmo as emissoras de rádio e TV, praticantes de outra máxima da sabedoria tradicional: manda quem pode, obedece quem tem juízo.

A desculpa de que canais de rádio e TV são “concessões” do governo é esfarrapadamente falsa. Toda a sociedade concede essas atividades a particulares: ao governo cabe apenas fiscalizar - como cobra os impostos, de todos nós - mas não tem o direito de ditar o que, como e a que horas deve ser transmitido.

O estrupício tem raízes em outro horror, velho de quase 80 anos: a Voz do Brasil, que ouvimos por obrigação desde o Estado Novo... E são como a jabuticaba: só existem no Brasil, mas não prestam nem para comer. Sociedades mais maduras e ciosas de seus direitos não permitiriam sequer que surgissem.

E, assim como a Voz, o horário do TSE, a CPMF que se foi (por razões políticas) e pode voltar a qualquer momento, estamos vendo multiplicarem-se – com velocidade suspeitamente crescente – coisas como a inconstitucional "Lei Seca", o "embelezamento das cidades" pela proibição da mídia exterior, o estranho pronunciamento do presidente-operário, de que precisamos de mais uma estatal para o petróleo novo... Enquanto isso, nós - sapos a caminho do cozimento – só percebemos um calorzinho gostoso...

J. Roberto Whitaker Penteado, no Propaganda & Marketing.

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