Devemos encerrar o monopólio para encontrarmos a verdadeira democracia transdisciplinar.
Poeta também precisa de modelos vivos. Esse papo de escutar vozes é loucura. Musa não existe, existe é modelo vivo.
Está explicado; está aí a causa do choro, da tragédia, da depressão, da hipocondria dos poetas. Sem ninguém para posar para eles. Para conversar. Perguntar se o verso está ficando bom. Debater se vai chover ou não. Acabam fugindo da realidade. Evasivos e herméticos. São incompreensíveis por pura falta de testemunhas. Não há um olhar suplicando:
- Já posso me mexer?
Escrevem qualquer coisa por ausência de interlocução, de observação, da exigência da pele. Ficam com o pincel na mão. Parados diante de uma tela de computador por horas, sem mudar o perfil e espiar o sofá.
Depois viram concretistas. Temos que parar com a mania de fechar a porta e não receber visitas. Esqueça o papel de eremita, eremita é um mendigo de banho tomado. Para que criar sozinho se nunca estamos mesmo sozinhos? Qualquer um escreve melhor acompanhado. Dois braços a mais para enterrar as provas do crime.
Lirismo é feito de carne, não de metáforas. A metafísica depende de um colchão para dormir.
Chega de natureza-morta, janela empoeirada, expresso frio. Modelo vivo agora! Um pouco de exibicionismo ajudará a perder a timidez. Abra dois botões de suas estrofes. Convide alguém para retratar. É um ponto de partida para fixar a tinta. Seremos mais pacientes, comparar o que enxergamos com o que pensamos, desejar o desejo como um ponto e vírgula.
O primeiro passo é transformar o escritório em ateliê. Nada de usar escritório no cartão de visitas. Diz que mora num ateliê mesmo que seja um bangalô. É mais charmoso. Ou que tem um estúdio na própria casa, ainda que isso signifique o antigo quarto de empregada.
Não tenho razão? Pois observe a vernissage dos pintores, dos escultores e dos fotógrafos: como são felizes, desencanados, alegres. O motivo é simples: têm modelos. Está na cara de que têm modelos. Observe a sessão de autógrafos de um poeta: suando, impaciente com a caneta, com medo de não ser aceito. Sua solidão é um chapéu virado. Cumprimentá-lo é coaxar moedas. Está na lata que mostrou seu inédito somente para sua mãe.
O pintor pode desenhar um botijão de gás a partir de uma beldade e não será processado. É liberdade autoral. Já o poeta....
Que poeta não se retraiu diante do pedido de leitora:
- Me faz um poema?
Retribua o apelo no ato, com firmeza de estivador:
- Sim, escrevo. Me serve de modelo?
Quando poeta convida uma mulher para posar, é acusado de devasso. O infeliz será preso por assédio. Mas, quando um pintor ou um escultor repetem a proposta, é arte. Cadê a igualdade de condições?
Recomendo que todos os poetas do país entrem em greve a partir de hoje. Nenhuma poesia até que tenham direito ao nu artístico.
arte: Modigliani
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