20.12.08

Mulheres-ópera

como confidentes de ambos os sexos reagem nos conselhos amorosos

Homem é mais reservado para se meter em briga de casal.

Não falará para seu amigo que a namorada ou esposa dele é uma piranha, uma traíra, uma vadia.

Seu vocabulário é de um parlamentar, cuidadoso com as contas secretas.

Sabe que é uma fria emitir um juízo definitivo para algo que pode mudar no dia seguinte.

Se o amigo desabafa, ele escuta e bebe. Mais bebe do que escuta e diz que está junto para tudo. Não detona ou destrói a ex. Desconfia que ainda não é ex, senão o marmanjo não sofreria daquele jeito a ponto de enxugar o rosto na camisa do garçom.

Ele recebe a sinopse da novela, de preferência um relato bem curto, e não queima os dedos com o calor das palavras.

Vá lá que decida espezinhar a companheira e o tonto volta para os braços dela na mesma noite.

Todo amigo de um amigo em apuros não se envolve porque será o primeiro a ser crucificado com a reconciliação.

Para firmar as pazes, não existe ética:

- O Fabrício não queria que a gente voltasse, amor.

- Por quê?

- Ele falou que você é um retrocesso na minha vida. Mas não acreditei e estou aqui.

A companheira descobrirá que o melhor amigo não desejava o sucesso dos dois. Sim, maldosamente, o homem delata seu escudeiro para readquirir a confiança de sua parceira.

Os relacionamentos doentios atestam de que não há como montar um sindicato masculino de ladrões. Só se eles forem padres...

* * *
Uma piranha, uma traíra e uma vadia são expressões mais usadas pelas mulheres. Gostam de ofender numa separação. Tanto faz que seja o namoro das outras.

O amor é o estádio de futebol feminino. A boca suja.

Estarão cegamente do lado das amigas. Não com elas, mas como elas.

Iguais na pele e no osso.

Torcem, vibram até com a cobrança de lateral.

Assumem para si as cafajestadas, as traições, os foras. Não têm distanciamento.

Choram ao telefone, engolem soluços. Guardam a vingança do recalque. Veículo da catarse das figuras que não se expressaram no percurso familiar, tolhidas pela rigidez dos costumes. A bisavô que não xingava nada em seu tempo toma o corpo delas e tira o atrasado.

Toda amiga de uma amiga em apuros é uma mulher-ópera. Diva da dor. Mais canto do que enredo. Acompanha capítulo por capítulo da novela, de preferência com descrição bem longa e detalhada.

Uma colega telefona e confidencia que sua paixão a traiu; ela nem escuta o final da história para arrematar que é insuportável viver assim, que o tipo é um pilantra, que ela deve pular fora. Não deixa quem sofre completar o raciocínio e expor o que pensa.

Desossa o vivente de cima a baixo, como funcionária do Imposto de Renda. Sem perdão. Sem indulto. Malha fina no ato.

Esse sujeito torna-se persona non grata para todo o círculo de confidentes que ele não conhece de sua amante. Terá uma espiã em seu encalço em cada bairro de sua cidade. Não vai relaxar mais para tomar um café num posto de gasolina 24 horas.

Assim como elas enforcam, transformam a corda em nó de gravata de casamento.

Na manhã seguinte, o cara prepara algo formidável, manda um buquê de orquídeas, desafia seus antecedentes, promete arrependimento e fidelidade. Muda de reputação na hora:

- Eu sempre acreditei nele, eu avisei que daria certo. Ahhh... Como você merecer ser feliz. Mais do que qualquer uma de nós.

arte: Francesco Del Cossa

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