9.5.09

Neuroses eclesiásticas (13)

Pois nossa vida de crente se parece com a dessas crianças adotadas inseguras. Onde já se viu reclamar de Deus?! (e a igreja faz coro de ajudante de ordens: “em tudo dai graças!”). Quem se permite “ficar de mal” com Deus? Ou questionar alguma coisa que leu na Bíblia? Não estou falando que Deus erra, ou que é injusto ou coisa parecida: estou falando da liberdade dentro da
nossa limitação, de podermos nos sentir seguros como filhos e filhas amados, que não serão açoitados se reclamarem ou discordarem de alguma coisa.

Qual é a mãe ou pai que nunca ouviu reclamação de seus filhos? Por isso há essa diferença entre as gerações: os adultos podem perfeitamente agüentar “ofensas” dos pequeninos, sem deixar de amá-los nem um pouquinho. Então, por que damos tanta seriedade a nossos sentimentos e palavras em relação a Deus? É porque temos medo; não estamos seguros de Seu amor em qualquer situação. Achamos (“sentimos”) que Ele nos ama quando somos bonzinhos. Mas se erramos...

Vale aqui uma explicação, pois há uma distinção complicada a fazer: Em todo o período anterior ao sacrifício de Cristo (e até hoje para os que não acreditam nele), a ira de Deus contra o pecado se revela de forma real, e inspira medo com muita propriedade - em última instância, o medo do fogo do inferno - exatamente o castigo do qual Jesus veio nos salvar. Mas agora não estamos falando exatamente disso. Há também um outro sentido de temor de Deus que permanece, e que poderia ser entendido como um respeito básico, e é positivo.

Como explica o rev. Ricardo Barbosa , trata-se de reconhecer o outro como alguém diferente e independente de mim, e configura a base necessária para haver um relacionamento. Tal como com outras pessoas, nossos pais, filhos, cônjuges, amigos: se não os respeitarmos como pessoa, não lhes daremos palavra nem direito a ser diferente, e não poderá haver intimidade de relacionamento.

Richard Rohr define o sentido bíblico do “temor do Senhor” como sendo simplesmente “ouvir com atenção”, prestar atenção no que Deus diz . Isso é positivo, e não causa neurose em ninguém. Mas em nosso meio, entre os filhos e filhas de Deus que crêem em Jesus, o temor continua sendo entendido no seu significado pré-cristão: medo que leva a obedecer cegamente. E isso faz bastante diferença - negativa - para a saúde emocional do cristão.

Pretendo explicar isso melhor na segunda parte do livro; por enquanto, vamos considerar como positivo o respeito para com Deus - que me leva a ouvi-lo com atenção, e negativo o que me leva a ter medo dele, e a guardar distância ou me esconder dele (como Adão e Eva logo após comerem o fruto proibido).

Karl Kepler, psicólogo, pastor e teólogo.

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