26.5.08

Brincando de marketing

"O homem tem uma capacidade inesgotável de mentir, especialmente para si mesmo" (George Santayana).

Todos os anos, nas grandes corporações, os chamados dinossauros que sobreviveram e ainda ganham muito dinheiro por trabalharem com produtos de consumo elevado e intenso, e aproveitando-se dos últimos momentos de um mercado que muito brevemente estará totalmente fragmentado em milhares e milhares de tribos, escalam equipe de jovens e supostamente talentosos executivos para brincarem de marketing.

Esses grupos, dentro do próprio país em que trabalham, ou mixando culturas e viajando para diferentes países, vão visitar, conviver, e passar dias, horas e até uma semana, com clientes de seus produtos e dos concorrentes. Alguns chegam até a morar, por alguns dias, com os clientes. Precisam decifrar e entender por que seus clientes se comportam do jeito que se comportam.

Aproveitam para dar entrevistas às publicações de negócios, onde pousam [sic] de inteligentes, sensíveis, compenetrados e, no dia, semana seguintes, voltam para seus escritórios gelados, no alto das torres, de onde continuarão olhando para o mercado, devidamente protegidos e cegos pelos ambientes assépticos, inodoros, inermes, insípidos, inóxios onde passam todos os demais dias, tomam suas decisões e, à noite, retornam para o aconchego de suas casas na certeza do dever cumprido.

Em que mundo vivem essas empresas? Que maluquice é essa que estão fazendo com seus talentos? E seus investidores, e os gestores de investimentos que compram os papéis dessas empresas continuarão assistindo e endossando o ridículo silenciosamente?

Com certeza jamais leram "Da Guerra" do General Klausewitz, pararam para refletir sobre as conquistas de Napoleão, e nem mesmo consideraram os ensinamentos de Al Ries e Jack Trout em "Marketing de Guerra". Continuam se incomodando com algumas das principais características de seus clientes fora do horário de trabalho, a quem discriminam, na prática, de forma medíocre e ostensiva. Esse mundo acabou.

Inteligência de mercado, assunto sobre o qual sempre gostam de discorrer, mas jamais de praticar, de verdade, é enfiar todos os dias, religiosamente, as botas no barro do mercado, mergulhar e se afundar nas trincheiras de combate onde as batalhas acontecem e a "guerra" se decide, é colocar a barriga no balcão, o pé na estrada, não por horas, dias, ou semanas. Todos os dias de todos os anos. Sem se descuidar um só momento sob pena de perder o dado essencial, a constatação relevante, o fato determinante e gerador do insight.

Tudo o que terão é uma fotografia bonita para mostrar a seus filhos, sorridentes e penteadinhos, e nada mais. Quem acredita nisso e gosta disso escolheu a profissão errada. E as empresas que continuam estimulando e convivendo com esse engodo, com essa encenação de terceira classe, merecem.

O marketing é infinitamente mais sério e mais importante do que esses momentos de recreação e diletantismo de jovens executivos.

Francisco A. Madia, no Propaganda & Marketing.

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